ANGOLA
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sites próprios


Eduardo José dos Reis Lopes
ex- Alferes Mil.º de Infantaria de Operações Especiais
'Ranger'
Cruz de Guerra de 4.ª classe
Companhia de
Caçadores 2600
Batalhão de Caçadores 2887
Angola - 1969 / 1971


Memórias de guerra
VII - Operação «vinde a
nós»
Para o final de 1970,
o CmdAgr2961 havia planeado uma série de acções
conjuntas e a nível do sector AM1, na região dos Dembos
entre os rios Lifune (a norte) e Zenza (a sul),
respectivamente sobre bases da FNLA e do MPLA: contra a
FNLA, os propósitos consistiam na captura ou destruição
de forças e recuperação de populações, através de
reconhecimentos ofensivos conjugados com emboscadas;
quanto ao MPLA, o objectivo era destruir a sua ligação
às populações e recuperá-las.
À minha CCac2600 coube a "Operação Vinde a Nós", junto
ao rio Lifune e sobre área de forte implantação da FNLA,
a ser executada por 2 GC (25 homens cada) e durante 3
dias.
Pelas 08:30 da 3ªfeira 01Dez70 e assim que 5 AL-III
pousaram nas imediações do aquartelamento de Balacende,
o meu 3º pelotão foi o primeiro a ser helitransportado e
decorridos cerca de 20 minutos largado numa lavra, de
imediato atravessada rumo a um trilho que tínhamos visto
do ar; (quanto ao 1º pelotão, pouco depois seria largado
a cerca de 3-4km dali).
Entrados no trilho, verificámos ser largo, batido e
limpo, significando que era muito utilizado. Tendo sido
até ali helitransportados em vôo perto de copas das
árvores, acreditávamos que íamos supreender o IN.
Percorridas umas centenas de metros, decidi lançar a
primeira emboscada numa curva pronunciada: mandei alto
e, após conferenciar com os meus furriéis Louro e
Pereira, montámos a clássica disposição em L, ficando no
troço frontal e a meu lado o apontador da MG-42 com a
equipa do 1ºCabo Coutinho, enquanto os restantes 19 se
instalaram paralelos ao trilho.
Não foi preciso esperar muito: passados uns 5 minutos,
ouvimos gente na nossa direcção em passo leve e
apressado, que na aproximação vimos serem 7 ou 8
"turras" da FNLA, uns velhos e outros novos, alguns
deles armados. O coração apertou-se e as pulsações
aumentaram, bati no ombro do apontador da MG-42 e as
minhas mãos crisparam-se na G-3, num movimento rápido
levei a arma ao rosto e aguardei: quando o homem da
frente estava a 30-20mts de nós, reprimi a vontade de
premir o gatilho e aguentei, aguentei... até a pequena
coluna IN entrar na zona-de-morte; fiz o disparo que
iniciou o nosso forte tiroteio (1 MG-42 e 24 G-3),
seguindo-se o tempo (6-7 segundos) de despejo do meu
carregador da G-3, que me pareceu uma eternidade. O
pessoal estava mais disciplinado a fazer fogo e se não
tinha um alvo, devia parar: foi o que fizeram; e voltou
a fazer-se silêncio sepulcral.
Deixei passar alguns segundos e levantei-me, mandei
montar o dispositivo de segurança e fui ao trilho para
me certificar dos estragos causados: à primeira vista
ali ficaram dois IN mortos; aproximei-me com o Furriel
Louro, revistámo-los e retirámos dois carregadores de
uma arma de repetição. Percorridos uns 100mts na
direcção de proveniência daquela coluna IN,
apercebemo-nos de gemidos vindos da mata e, com as
devidas precauções, saímos do trilho até nos depararmos
com um corpo caído, tendo uma cabarina Simonov na mão
esquerda e uma massa de sangue no seu lado direito, com
os intestinos parcialmente de fora: o 1ºCabo Coutinho
pegou na Simonov e logo a seguir o 1ºCabo enfermeiro,
debruçando-se sobre o corpo e pegando-lhe no pulso
esquerdo, confirmou que pouco tempo de vida lhe
restaria; chamei o "francês" (soldado com 30 anos e
ex-emigrante em França), voltei-lhe as costas e pouco
depois cessaram os gemidos.
Passamos o resto da 'op' a montar emboscadas durante 4-5
horas, mudar de local e assim sucessivamente: numa
dessas emboscadas apanhámos a Madalena Congo que, com o
filho às costas, vinha a fugir do 1º pelotão; devido ao
seu estado de desnutrição e por trajar apenas uma tanga,
aquela mulher veio a ser notícia na rádio e em jornais
da província.
Na manhã de 03Dez70 dirigimo-nos a dois acampamentos
que, pouco após lançada a 'op', havíamos localizado pelo
latido de cães e cacarejo de galinhas: entrados nos
acampamentos – já sem viv'alma –, passámos revista a
todas as casas-de-mato e destruímos todos os utensílios,
criação e ovos, recolhemos algumas bacias de esmalte e
pratos de alumínio, concluindo pelo incêndio das
casas-de-mato. Ainda a meio daquela manhã, antes de nos
dirigirmos ao local de extracção, largámos fogo a duas
lavras de milho.
Por volta das 13:00, chegámos ao morro onde o 1º pelotão
já aguardava extracção pelos helis. Reforçado o
perímetro de segurança e almoçados, aguardámos até por
volta das 14:00, quando surgiu o "Lobo Mau" com a
esquadrilha de AL-III que, naquela primeira leva,
recolheu o 1º pelotão.
Cerca das 15:00 os helis reapareceram para nos "extrair"
mas um grupo da FNLA, entretanto instalado na mata
próxima, alvejou os nossos AL-III quando levantaram,
forçando o "Lobo Mau" a entrar em acção.
Sem mais sobressaltos, decorridos cerca de 20 minutos
pousámos na pista de Balacende e dirigimo-nos ao comando
da companhia, onde entregámos 2 carabinas Simonov: o
capitão Hermínio Batista demonstrou-nos o seu apreço,
pois aqueles "troféus" representavam prestígio de
"acções em combate", não apenas para a CCac2600 como
para todo o nosso BCac2887.
Na antevéspera do Natal de 1970, o comando da AM1 deu
por concluída – com sucesso –, mais uma série de
actividades anti-guerrilha das NT, nos Dembos do Norte.









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