
TRABALHOS, TEXTOS
SOBRE OPERAÇÕES MILITARES ou LIVROS
Texto e imagens cedidas por
LC123278
David
Martelo
David
Manuel de Matos Martelo: nascido em 1946, em Viseu; em
1963 ingressou na AM, onde concluiu o curso de
Infantaria; seguidamente cumpriu duas comissões em
Angola, a última em Ago70-Ago72 no enclave de Cabinda
como capitão comandante da CCac2738/RI2-Abrantes;
posteriormente colocado como professor na Escola Central
de Sargentos em Águeda, em 09Set73 foi co-subscritor da
"contestação" das Alcáçovas e em 05Mar74 participou no
"conclave" conspirativo de Cascais; e no dia seguinte
foi transferido para o BC3-Bragança; em 22Jul75
ressurgiu como suplente da "comissão técnica da Arma de
Infantaria", reunida em assembleia na EPI-Mafra. Com os
cursos de "Infantry Officer Advanced Course" (de Fort
Benning), e de Estado-Maior, desempenhou funções de
comando na Brigada de Forças Especiais e em 1990 foi
colocado no comando das Forças Terrestres Aliadas do Sul
da Europa. Em 1993 foi nomeado CEM/RMN e em 1995 passou
à reserva com o posto de coronel, iniciando actividade
como escritor, "privilegiando o debate dos temas de
defesa contemporâneos e a história militar". É agraciado
com a Medalha de Mérito Militar de 2ª Classe e com a
Grã-Cruz da Ordem da Liberdade.
"1974, cessar-fogo em África"
"1974,
cessar-fogo em África"
autor: David Martelo *
editor: Publicações Europa-América (col. Estudos e
Documentos, 303)
1ªed. Mem Martins,
2001
21x14cm
253 págs
preço: 18,41€
ISBN: 972-1-04889-5
Recensão (1):
– «A já vasta bibliografia disponível sobre o fim do
Império Colonial Português tem secundarizado - ou mesmo
omitido - o período de transição que percorre o
derradeiro ano da guerra e se prolonga pelos primeiros
quatro meses do pós-25 de Abril até ao estabelecimento
da paz. Neste seu novo livro, David Martelo analisa -
com o rigor documental e capacidade analítica a que já
habituou o leitor - esse tempo de hesitações e dúvidas,
estabelecendo a "ponte" indispensável entre a guerra e a
descolonização. Através de um expressiva e elegante
narrativa, o autor transporta os leitores para o cenário
de um dos momentos mais decisivos da história de
Portugal: o de saber se era a Democracia que
proporcionaria a Descolonização ou se, pelo contrário,
era a Descolonização que possibilitaria a Democracia.»
[ Natália Luís
Moreno, 25Jun2001, in
http://www.regiao-sul.pt/noticia.php?refnoticia=1054
]
Recensão (2):
– «Na parte final da obra, David Martelo recorda o
longo processo que conduziu ao cessar-fogo na Argélia,
em 1962, numa comparação que considera recomendável
anteceder qualquer adjectivação da descolonização
portuguesa. "1974 – Cessar-Fogo em África", é uma obra
essencial que ficará, por certo, nos anais da
estatística nacional, quer pelo seu valor documental e
literário quer pelas características de exactidão e de
"colocar o dedo na ferida", que tão bem caracterizam o
autor.»
[ in
http://www.livapolo.pt/index.php?action=artigo_detalhes&artigo_id=41843
]
Recensão (3):
– «Uma guerra ganha no terreno e perdida à mesa das
negociações? Esta é uma das teses refutadas por David
Martelo.
Em 1994, o último Governo de Cavaco Silva publicava a
chamada "lei dos coronéis". O objectivo anunciado era o
de racionalizar meios humanos e poupar dinheiro. Algumas
centenas de oficiais foram, por esta via, mandados para
casa. Um dos abrangidos chamava-se David Martelo. Uma
vez na reserva, passou a dedicar-se a escrever livros
sobre aquilo que melhor conhecia: a instituição militar
e a sua história. Logo em 1997 publicava na
Europa-América O Exército Português na Fronteira do
Futuro. Seguiram-se As Mágoas do Império (1998) e A
Espada de Dois Gumes (1999).
Este novo livro aborda o cessar-fogo em África em 1974 e
depois dele outros projectos estão na forja. O
suficiente para o general Loureiro dos Santos, que fez a
apresentação pública do livro, considerar que "pelo
menos numa coisa a lei dos coronéis teve um efeito
positivo" - perdeu-se um oficial mas ganhou-se um
escritor. Nascido em 1946, David Martelo formou-se na
Academia Militar, fez duas comissões de serviço em
Angola e, em 1974, na altura com a patente de capitão,
participou no Movimento das Forças Armadas. O facto de
não ter formação específica como historiador não o
intimida. Afinal, Charles Boxer, autor de "O Império
Marítimo Português", também era oficial de carreira. "O
meu fascínio pela História remonta às colecções de
cromos do tempo da escola primária. Da minha mãe,
professora de História e de Português no liceu da então
Sá da Bandeira, em Angola, herdei o gosto de analisar o
passado e escrever com rigor".
De regresso a Angola, já nos anos 60, teve, como oficial
acabado de sair da Academia, uma primeira premonição de
que o futuro não iria ser fácil. O camionista de quem
apanhara boleia para se apresentar na sua unidade
disse-lhe duas coisas: que até ao Caxito (60 km a sul
[!?] de Luanda) não precisava de levar a arma no colo e
que a tropa nada estava a fazer em Angola, a não ser
inflacionar as rendas de casa.
Este divórcio entre os portugueses residentes nas então
Províncias Ultramarinas e as Forças Armadas degeneraria
mais tarde em casos de conflito aberto, por exemplo em
Moçambique pouco antes do 25 de Abril. E só tinha
paralelo no distanciamento da população da metrópole,
"não tanto em relação à guerra, mas ao destino de um
império, pressentido como longínquo". Um império que,
como lembra Martelo, condicionou a política portuguesa
durante 500 anos e cujas crises estiveram na origem de
mudanças dramáticas (queda do absolutismo, queda da
monarquia, imposição do Estado Novo, queda da ditadura)
e até da perda da independência (morte de D. Sebastião
em Alcácer-Quibir).
Basta pensar nos sacrifícios imensos para manter um
"absurdo estratégico", as praças-fortes no Norte de
África, que quando muito serviam para o rei poder
acrescentar aos seus títulos o de "aquém e além-mar em
África". Prudente, o infante D. Pedro escrevia em 1437
ao seu irmão, o rei D. Duarte, tentando dissuadi-lo da
(depois malograda) expedição a Tânger: "Não faço dúvida
em ser bem e serviço de Deus os mouros (...) serem
guerreados, contanto que este bem não traga consigo
danos e males muito maiores".
Os "danos e males maiores" sucederam-se e, no dizer do
autor, "como é que de derrota em derrota se poderia
esperar que o império português terminasse em apoteose"?
Por isso, a questão decisiva em 1974 era o tempo. E a
falta deste condicionava cada vez mais a resposta à
pergunta: qual fazer primeiro, democratizar ou
descolonizar? Tal como referia De Gaulle em 1961 a
propósito da Argélia, do "enrolar das bandeiras e do
regresso à metrópole" dependia o futuro do país e o seu
posicionamento a nível mundial. "Penso que dentro de 100
anos o 25 de Abril será recordado muito mais pelo corte
com as amarras do Império que com a restauração da
democracia", adianta o autor de "1974 Cessar-Fogo em
África".
A presente obra nasceu como uma pequena investigação.
Mas, ao mergulhar na documentação e ao reler os jornais
da época descobriu "tanta coisa interessante" que o
livro não tardou a surgir: escrevê-lo demorou 58 dias.
Uma coisa que o impressionou em muitas das obras
publicadas sobre o 25 de Abril e a descolonização foi a
forma "pouco rigorosa, marcada pela visão
político-ideológica e o tom muitas vezes
autojustificativo" dos respectivos autores. Cita a
propósito a divergência entre a análise sombria da
situação militar em Moçambique feita em 1973 pelo então
comandante-chefe, Kaulza de Arriaga, e a visão optimista
dessa mesma situação expressa pelo mesmo general quando
anos depois publicou "Guerra e Política". Para ele e
para os seus camaradas Luz Cunha, Bettencourt Rodrigues
e Silvério Marques, co-autores de "Vitória Traída", a
guerra em África em vésperas do 25 de Abril tinha o rumo
sugerido pelo título do livro.
"Como se pode falar em vitória" - contrapõe David
Martelo - "se a maior parte das companhias era comandada
por milicianos?" Como podia continuar a guerra "se os
candidatos à Academia Militar eram cada vez menos"? Com
45% do Orçamento do Estado dedicado às operações
militares, "como poderia o país alguma vez progredir"?
Os equipamentos eram desadequados: navios concebidos
para operar no Mar do Norte a actuar em clima tropical;
inexistência de veículos blindados de transporte de
pessoal até à tardia chegada do Chaimite (quando se
sabia que nas emboscadas a maior parte das baixas
ocorria nos primeiros 30 segundos de fogo inimigo);
enquanto a doutrina do Pacto de Varsóvia aconselhava 18
bocas de fogo por pelotão (para 300 ou 400 metros de
terreno), havia unidades portuguesas que não passavam
das duas, isto enquanto o PAIGC se dava ao luxo de
deixar os pratos dos morteiros já preparados nos
arredores das posições fortificadas portuguesas.
Para o autor, "faltava um livro como este que, deixando
de lado as polémicas da descolonização e do processo
revolucionário, se concentrasse na análise daquilo que
condicionava tudo o resto: a situação militar, o moral
das tropas e os meios em presença". Ou, por outras
palavras, "não basta definir políticas, por muito justas
e patrióticas que pareçam; é preciso perceber se há
meios para as executar".
O mesmo se aplica na actualidade. Se a política externa
portuguesa implica o envolvimento das Forças Armadas em
missões internacionais (Bósnia, Kosovo, Timor, etc.),
então há que garantir os meios correspondentes, sob pena
de "um dia vir a haver no empenhamento externo uma
catástrofe idêntica à da ponte de Entre-os-Rios".
Na polémica sobre o urânio empobrecido, que, de resto,
"atingiu um pico e depois se esgotou, como é próprio da
sociedade hipermediatizada em que vivemos",
manifestou-se muita confusão, "quer da parte de sectores
da população quer de forças políticas".
Uma das ideias mais interessantes deste livro é que os
exércitos de recrutados "tendem em momentos de bloqueio
a transformar-se em força política e a agir, ainda que
por vias não muito ortodoxas militarmente falando, de
uma forma que se identifica com a maioria da nação".
Tendo David Martelo defendido no seu primeiro livro a
profissionalização das forças armadas não haverá neste
ponto alguma contradição? A conversa que começara horas
antes num restaurante da Baixa do Porto terminou já no
passeio da Rua Sá da Bandeira: "É verdade que umas
forças armadas profissionais nunca teriam feito o 25 de
Abril. Mas também nunca teriam feito o 28 de Maio..."
[ Rui Cardoso, in
"Expresso" (caderno Livros), 07Jul2001 ]
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