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Joana Pontes

 

Margarida Joana Quaresma Tomás Pontes, licenciou-se em Psicologia pela Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação da Universidade de Lisboa.


Em 2003 concluiu, no Instituto de Estudos Políticos da Universidade Católica de Lisboa, o Programa Avançado em Jornalismo Político.


Os seus interesses de investigação estão direccionados para a História Contemporânea de Portugal, especialmente para o período final do Estado Novo, 1960-1974.


É membro da direcção da Liga dos Amigos do Arquivo Histórico Militar.


Em 14Mar2018, sob orientação do prof. dr. Luís Nuno Rodrigues (ISCTE-IUL), realizou a prova de doutoramento em História - na especialidade de "Impérios, Colonialismo e Pós-Colonialismo" -, com a tese epigrafada "Sinais de Vida: Cartas da Guerra 1961-1974".
 

O livro:

 

"Sinais de Vida: Cartas da Guerra 1961-1974"

 

 

título: "Sinais de Vida: Cartas da Guerra 1961-1974"
autoria: Joana Pontes

editor: Tinta da China
1ªed. Lisboa, 29Nov2019
408 págs
21x16cm
pvp: 18,90 €
ISBN: 989-6715-22-9

 

Sinopse (do editor):


- «A guerra colonial através da correspondência de pessoas como nós.


16 arquivos, 4400 cartas e aerogramas, 11300 páginas enviadas.
Em 13 anos de Guerra Colonial, de Angola para Portugal, de Portugal para Cabo Verde ou Moçambique, entre namorados, pais e filhos, amigos-irmãos e irmãos-irmãos, circularam milhares de cartas - a expedição média de correio entre as colónias e a metrópole atingiu o impensável número de dez toneladas por dia.


São arquivos pessoais valiosos, que emprestam perspectivas e sensibilidades íntimas a um conflito de carácter global, e que se têm vindo a perder. É essa perspectiva que este livro recupera, partilhando testemunhos e histórias privadas que são, apesar disso, reconhecíveis por milhares de pessoas, e que constituem um posto privilegiado de observação sobre uma era marcante da história portuguesa.»

Apresentação da obra (excertos de entrevista que a autora concedeu à agência noticiosa 'Lusa'):


- «A historiadora Joana Pontes defende ser "devida uma homenagem" aos militares mobilizados, que prestaram serviço na Guerra Colonial (1961-1974).


"Deve haver, da parte das pessoas de hoje, uma homenagem a esses militares, e perceber estas pessoas no seu contexto. Há que perceber as pessoas neste contexto. E era obrigatório ir. E a maioria foi em condições muito complicadas. Além desse reconhecimento, em falta, há que dar a conhecer o que foi a circunstância da Guerra e a maneira como, de facto, as pessoas não percebiam muito bem o seu império. [...] Foi gente que passou ali um muito, muito mau bocado, e lamento muito que não se preste a estas pessoas uma homenagem. Lamento que não se preste a devida atenção e se reconheça que de facto eles foram servir a Pátria, e isso foi um acto de enorme generosidade; mas como a guerra foi considerada ilegítima depois do 25 de Abril de 1974, caiu-se tudo numa espécie de limbo, em que se prefere não falar nisso. Eu acho que estes militares, os que foram mobilizados, sentem muito não serem reconhecidos, que não se reconheça o sacrifício. E, ao ler as cartas, acho se percebe o que foi a vida dessas pessoas, com 20 anos, separadas das famílias, durante pelo menos dois anos, lá longe, muito longe, num inferno. [...] É tudo muito triste porque são jovens, com 20 anos, eles e suas noivas. Às vezes, digo isso aos meus alunos, imaginem-se com 20 anos, lá longe, sem ninguém, foi terrível."


Nas transcrições de algumas das missivas, na obra, são notórios os erros de ortografia, o que corresponde a uma "muito fraca alfabetização", que era comum a quem era recrutado e aos que ficavam. O que constituiu "uma dificuldade à investigação". [...] Além da família e amigos, os militares correspondiam-se com as "madrinhas de guerra", jovens que lhes escreviam como um meio de apoio moral e psicológico. Algumas, como é referido no livro, tornavam-se namoradas e futuras mulheres.


A investigadora atesta ainda que "não havia uma politização clara": "As pessoas não sabiam exactamente o que se estava a passar no contexto internacional, porque é que a descolonização teria de existir. Este tipo de considerações não estava presente na mente das pessoas".


A investigação destas missivas, colocando na narrativa histórica não apenas as elites sociais, políticas, militares ou religiosas, mas também "as pessoas comuns e a sua vivência dos factos", permite "compreender a política num sentido mais lato", ao mostrar "como estas pessoas estiveram a viver esta missão e em que condições". [...] As cartas são "uma forma de diário". E se só alguns escreveram diários, contou a historiadora, "certo é que todos escreveram cartas", dando conta do seu estado de espírito, e das condições em que combatiam.»

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Recensão

Por João Céu e Silva,

jornalista do Diário de Notícias
07Dez2019 - 00H04

 

 Foto-Fernando-Farinha

 

A memória da Guerra Colonial portuguesa (1961 a 1974) tem sido em grande medida "privada", "difícil de constituir" e as "comemorações oficiais olhadas com desconfiança". Esta é a realidade que suporta uma das mais recentes investigações sobre a Guerra Colonial, publicada sob o título Sinais de Vida - Cartas da Guerra 1961-1974, e que tem como base a análise da correspondência que os militares enviavam ou recebiam durante o conflito.


A autora, Joana Pontes, consultou muita da correspondência reunida no Arquivo Histórico Militar, que nos últimos anos recebeu vários espólios através do Projeto Recolha. Segundo o ex-diretor do Arquivo, esta correspondência de guerra reporta ao período entre 1961 e 1974, altura em que "todos os portugueses, homens e mulheres, crianças, jovens, adultos e velhos, viram as suas vidas condicionadas durante 15 anos pela Guerra Colonial", designadamente os nascidos entre 1940 e 1954, e estiveram sujeitos à mobilização militar para cumprir serviço militar em Angola, Moçambique e Guiné. Na introdução a Sinais de Vida, Aniceto Afonso considera que "todos os portugueses acabaram por ser envolvidos pelo ambiente social resultante da guerra".


O facto de esse esforço de guerra ultramarino ser até à Revolução do 25 de Abril uma causa nacional para o governo e de ter sido um desígnio patriótico eliminado de um dia para o outro fez que, segundo a autora, "passasse a ser encarado como ilegítimo" e a narrativa histórica que seguiu excluir ex-combatentes, retornados e famílias que tiveram filhos e maridos no cenário de África, fazendo que os almoços de confraternização entre antigos combatentes sejam os "principais momentos de rememoração deste passado comum".


Esse envolvimento nacional é bem visível nas cartas que recheiam as 400 páginas do livro e verifica-se a todos os níveis - e nos dois sentidos -, como se pode ver na troca de correspondência entre uma madrinha de guerra e um militar (p. 113) em que ela descreve os horários de trabalho numa fábrica, cartas em que a noiva reclama por não ter um coração desenhado na missiva (p. 54) - o noivo responde que não queria ser gozado pelos outros -, ou o militar que dá notícia que vai para frente de combate (p. 228) -"a sorte não me bafejou pois vou para a zona mais apoquentada que é Nambuangongo" -, e aquele que não vê guerra a acontecer (p. 278) e escreve: "Chego a perguntar a mim próprio se estou no Ultramar ou numa festa ou então numa companhia de malucos porque todos riem brincam pulam".


A ameaça da morte é também um dos temas recorrentes do livro (p. 324): "Há dias no Quiterajo uma mina reforçada limpou 11 soldados !!! em segundos"; ou "A minha companhia continua com azar e ontem lá se foi ao ar mais uma viatura. A atividade dos turras tem aumentado muito"; e dramas: "Há 2 dias morreram 2 capitães de uma assentada. Um aliás bem meu conhecido, e tinha cá a esposa. A desgraçada da senhora quando soube da notícia tentou suicidar-se (estava grávida ainda por cima)."


As críticas aos altos superiores hierárquicos ou responsáveis pela estratégia colonial surgem muitas vezes referidas na correspondência, como Kaúlza de Arriaga por exemplo, e são feitas muitas vezes com irritação e palavrões pouco abonadores. A mesma situação de linguagem tão crítica como popular verifica-se repetidas vezes nas queixas sobre a eternização do conflito (p. 352): "Não há meio de eu acabar esta merda."


Não falta nesta correspondência palavras de esperança também, como é o caso dos militares que estão para regressar (p. 222): "Começo por te dizer que é esta a última carta que te escrevo de Angola: pois em breve me encontrarei em Lisboa se Deus quizer." Ou na página seguinte, um outro militar a informar: "Voute dar um mumento de alegria pois tenho te a dizer que è o nosso embarque no dia 30."


Para a autora, a correspondência de guerra passa por vários níveis de consciencialização politica. Se nos primeiros anos de conflito após as sublevações e massacres indiscriminados em Angola de centenas de pessoas, habitantes e colonos de todas as raças e idades, os primeiros militares a regressarem da guerra ainda estavam imbuídos da visão de defesa de um império. Na primeira fase de correspondência, refere, existe um retrato de um "país uno, pluricontinental e multirracial, do Minho a Timor", mas também uma descoberta de "um mundo diferente do que até aí conheciam", e as histórias que esses primeiros contingentes foram descrevendo irão "influenciar de forma decisiva o futuro do conflito".


Quem estava para ser mobilizado, explica, irá "encarar a sua participação na guerra" através das "histórias que [os primeiros a combater em Angola] contaram por escrito e, mais tarde, de viva voz", tendo essa correspondência antecipado a experiência que iriam viver nos sucessivos embarques para as províncias ultramarinas. Prova dessa perceção, demonstra, é a diminuição das candidaturas à Academia Militar: "Diminuem a partir do ano letivo de 1962-1963 e é também o primeiro ano em que ficam vagas por preencher." O número mais alto desta desistência será nove anos depois, sendo que em 1970 os jovens que nem se apresentaram à inspeção foi de 20,9%, ou seja 18500.


Quanto ao impacto dessas narrativas de guerra, a autora é da opinião de que "terão decerto pesado na decisão de emigrar, provavelmente de forma clandestina, de um número não quantificável de faltosos [à inspeção]", bem como de uma grande importância junto dos refratários e desertores. Explica que a "ideia persistente de que a guerra estava para durar, ligada à ausência de perspetivas futuras, terá contribuído para um clima de cansaço que é central na correspondência".


Uma das conclusões que também é retirada da correspondência é a "reduzida familiaridade e adesão à missão a desempenhar, o que poderá estar associado à ausência de compreensão da questão colonial". Outra, a da cada vez maior contestação à guerra no continente de que os militares mobilizados se apercebem ao ouvir emissões radiofónicas contra o regime português - Rádio Moscovo, a "rádio" Maria Turra (Brazzaville) em Angola e a Rádio Conakry na Guiné, além da imprensa da oposição e de canções como as de José Afonso e Adriano Correia de Oliveira.


Entre outras conclusões que a autora retira desta correspondência é a da grande vontade de regressar sem ser ferido, evitando expor-se aos riscos, ou de que a "crença na virtude do sacrifício exigido a todos para defender a pátria se vai esbatendo ao longo do tempo da guerra".
 

 

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