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Médico José PratasJosé Pratas

 
José Manuel de Almeida Ferreira Pratas, entre o final de 1971 e fins de 1973 prestou serviço militar na Guiné, como alferes miliciano médico, colocado inicialmente em Pirada (posto fronteiriço no nordeste), sede do Batalhão de Cavalaria 3864.
Actualmente, médico especialista em gastrenterologia, aposentado da função pública.

 

O livro:

 

«Senhor médico, nosso alferes – Guiné, os anos da guerra»

 

 

Senhor medico nosso alferes capa
título: "Senhor médico, nosso alferes – Guiné, os anos da guerra"
autor: José Pratas


editor: By the Book
1ªed. Lisboa, Out2014
150 págs (ilustrado c/fotos p/b)
21x15cm
preço: 12€
ISBN: 989-8614-21-6

 

- Apresentação:

Clique no sublinhado que se segue para visualização do conteúdo
O livro de José Pratas

(Rui Gonçalves, 24Out2014)

 

- Recensão (1)

 

«Muito interessante este relato da vivência de um médico, José Pratas, durante a sua comissão de dois anos na então Guiné Portuguesa, em 1971 / 1973. É um olhar sobre a guerra do ponto de vista de quem pela natureza do seu trabalho, se vê colocado "ao nível do soldado da quadrícula", e daí nos descreve de modo primoroso mas implacável, além da brutalidade do conflito, aquilo que o marcou nas relações pessoais e de serviço com militares e civis, metropolitanos e locais.


Mais de 40 anos depois de terminada a comissão de serviço, o Dr. José Pratas recorda, por vezes com detalhes notáveis – por exemplo os diálogos e as apreciações que faz de diversas personalidades que com ele se cruzaram –, episódios daquilo porque passou no cumprimento do serviço militar obrigatório, em Mafra na Escola Prática de Infantaria e em aquartelamentos "no mato" do Comando Territorial Independente da Guiné. O livro é aliás mais aquilo que rodeia o autor do que propriamente uma descrição – embora a tenha a espaços –, da sua acção pessoal no desempenho da medicina em campanha.


São dez episódios de leitura fácil e aliciante, mas que também nos deixam aqui e ali um travo amargo pela descrição que faz de pessoas com quem lidou e de situações que viveu. Algumas mesmo dramáticas, como a morte de cinco cadetes em Mafra ou a resistência heróica de um punhado de militares num perdido destacamento no nordeste da Guiné, junto à fronteira, resistindo com escassos meios aos ataques do PAIGC.


É um livro que destrói em várias ocasiões uma visão romântica do modo português de fazer a guerra que tem sido ao longo dos anos muito adoptada sobretudo pelos militares dos quadros permanentes que a viveram e a recordam também em livro – José Pratas, com excepções, arrasa os oficiais superiores, mesmo os médicos, que "faziam a guerra em Bissau" e o seu modo de vida na colónia –, mas ao mesmo tempo, também destaca o esforço da acção não-militar das nossas tropas e opina que essa atitude, independentemente das suas razões naturalmente ligadas à estratégia definida pelo comando militar, teve impacto muito positivo na vida das populações – nunca antes tiveram tantas condições e apoios ao desenvolvimento –, e até, faz questão de frisar, terá levado o inimigo a abrandar a sua acção militar em certas regiões.


A visão que o alferes miliciano médico José Pratas nos dá das limitações materiais e humanas nas forças portuguesas em situações de campanha muito difíceis – este médico esteve sempre no "mato" e a sua expectativa de uma colocação em Bissau nunca se concretizou –, é talvez o facto mais marcante e interessante do livro, para quem não viveu a guerra e sobre ela tem curiosidade analítica. Para quem esteve na Guiné como este médico, a cumprir o serviço militar nos aquartelamentos da "quadrícula", certamente se identificará com muito do que aqui está escrito.


No entanto não se pense que tudo foi negativo para José Pratas, também enaltece, e muito, os enfermeiros militares que sem formação adequada nem meios acompanhavam as tropas e a quem cabia o primeiro apoio aos feridos, fazendo milagres; os soldados, talvez tratados com algum paternalismo simpático, são inegavelmente defendidos pelo médico; tem referências positivas e elogiosas a pilotos e a unidades de elite com as quais contactou e também a oficiais da "quadrícula", como um comandante que teve, antipático mas reconhecidamente competente, ou o colega oficial superior médico que o apoiou e ajudou numa altura de grande debilidade, tolhido pela doença e verdadeiramente abandonado em Bissau, ou, só para dar mais um exemplo, o comandante do NRP Montante (uma Lancha de Desembarque Grande), cuja insígnia sempre manteve e ainda hoje está no seu gabinete de trabalho.


Arrasador para um elemento da DGS com o qual conviveu, dedica-lhe mesmo um capítulo, como dedica um aos capelães – com uma interessante visão sobre o apoio religioso às tropas em campanha –, acerca dos quais também pouco ainda se sabe da sua acção na guerra; muito elogioso para um civil português que vivia e trabalhava junto a um quartel, faz também algumas considerações que vão além da sua vivência pessoal, pronunciando-se sobre o evoluir da guerra na Guiné, as limitações que por ali se viveram depois dos ataques com misseis aos meios aéreos portugueses, manifestando a convicção pessoal que a guerra estaria perdida para as forças portuguesas.


De alma e coração com os antigos combatentes, e em especial os da Guiné, reconhecendo a falta de atenção dos poderes públicos da democracia pelos que se bateram em África, José Pratas não poupa nem o ensino universitário da medicina que não preparava os médicos para a guerra, nem a hierarquia militar, mesmo a que estava no terreno vista em parte dos casos como incompetente, mas sobretudo a dos gabinetes em Bissau: os que íam ver a guerra de máquina fotográfica, voltavam no mesmo dia ao ar condicionado, com histórias para contar. A enorme diferença entre as condições de vida na "quadrícula" onde o autor sempre esteve, e Bissau por onde passou ocasionalmente, não foi coisa que o alferes miliciano médico Pratas aceitasse de ânimo leve. A isso foi obrigado e deixa-o bem claro hoje.


O testemunho do Dr. José Pratas deve ser lido por todos os que se interessam pela história da guerra no antigo Ultramar e em especial na Guiné. Aqui e ali pode a sua opinião sobre o evoluir da guerra estar enviesado pelo posto de observação que na altura tinha, muito junto ao terreno! Mas essa é também uma das grandes mais-valias deste livro, é alguém que olha para o que o rodeia e nos transmite uma realidade sem os habituais filtros que impedem muitos, sobretudo os militares de carreira, de contar toda a verdade sobre muitas incompetências e lacunas que todos viram e sentiram.


Uma nota final para as excelentes fotografias a preto e branco que ilustram a obra, da autoria de outro médico militar miliciano – João Trindade – que escreve um sentido Prefácio à obra, e ao qual retiramos este excerto:


"…Vão, portanto, ler um livro sério, escrito com arte e sabedoria, numa prosa elegante, fluente, simples e apelativa, com excelente dinâmica, com passagens de grande beleza poética – a poesia, hoje, prescinde muitas vezes da métrica e da rima –, salpicada de histórias quer divertidas quer dramáticas e comoventes, harmoniosamente entrosadas, com equilíbrio e perspicácia, dando força à narrativa dentro da matriz autobiográfica; uma obra em suma, com inegável valor literário…"»


(1) Miguel Machado, 17Nov2014

 

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- Recensão (2)


Em dado passo, José Pratas exproba esta amnésia do poder político que recai sobre os antigos combatentes: os povos que esquecem os seus bravos não terão um final mais feliz do que o daqueles que queimam os seus livros; e mais adiante mostra a sua expetativa de "que as novas gerações recuperem da história recente o exemplo de resistência e luta pela sobrevivência, que talvez lhes sirva nas adversidades atuais que o país enfrenta".


Mas vamos ao que importa: os médicos militares estão de parabéns, têm aqui o seu cronista bem documentado a explicar a todas as gerações o que foi a guerra, por onde passava o poder do médico. Até onde podia chegar este médico militar? José Pratas faz o enquadramento: "Com os escassos recursos disponíveis, os médicos deveriam ser os provedores da saúde física e mental de dezenas ou centenas de militares que junto deles encontrassem o abrigo para muitos dos seus padecimentos. Por isso lhes competia, para além de socorrer os feridos e confirmar os mortos, a obrigação moral e o dever profissional de se baterem pela melhoria razoável dos meios e das condições de sobrevivência que, apesar dos constrangimentos, ajudassem a minimizar as circunstâncias da guerra: vigilância da qualidade e quantidade da alimentação dos militares; higienização de abrigos e dormitórios; carência de material e equipamento sanitário adequados aos condicionalismos do isolamento; pedagogia dos hábitos de saneamento básico junto das populações e introdução de procedimentos clínicos elementares, por exemplo, na área da saúde materno-infantil".


Como se chegava a médico militar? O autor esclarece: "Concluído o 1º ciclo do COM, aos médicos, estava-lhes destinada a Escola de Serviço de Saúde na Estrela, em Lisboa, onde os esperava, durante cerca de três meses, um obsoleto e imbecil programa, deslocado dos contornos e exigências da guerra que iriam enfrentar. Entre despropositados conceitos de higiene e enfadonhas noções de organização sanitária, decorreram doze semanas de tédio e desperdício de tempo, consumido num insulto à inteligência de cada um".


Numa noite de tempestade de inverno, o nosso alferes médico encontrou um telegrama debaixo da porta: "Embarque 28.12.1971/04 horas, destino CTIG, comparência imediata STOP". É assim que ele vai aterrar em Pirada, mesmo junto à fronteira do Senegal. É aqui que presta consultas internacionais, diariamente acorriam largas dezenas de doentes, muitos deles oriundos do Casamansa, e dá-nos o ambiente:


"No interior da tenda militar, mastigavam-se nuvens de poeria irrespirável que aquela gente levantava ao arrastar-se no seu jeito indolente, derretidos em cascatas de suor. Pirada era um forno. O furriel enfermeiro José Luís Passos, partilhava comigo o tremendo sacrifício que fazíamos para atender, depois da consulta militar, toda esta multidão. Com pouco mais de 20 anos, o Passos era já merecedor de um louvor pela sua destemida disponibilidade, certa vez que foi necessário integrar um pelotão que partiu em socorro do destacamento de Copá, que estava a ser flagelado num ataque com feridos".


E exalta o míster destes enfermeiros: "Tecnicamente mal habilitados, como não podia deixar de ser, compensavam com a sua generosidade e dedicação o que lhes faltava em preparação profissional. Era neles que no interior do mato, em momentos de atribulação, os militares e as populações depositavam confiança".


E fala dessas consultas de rotina, os analgésicos, antidiarreicos e antipalúdicos, das febres, da malária, "e das doenças envergonhadas, homens e mulheres escorrendo as consequências venéreas de relações promíscuas, passando pelas gigantescas hérnias inguino-escrotais e os intransportáveis hidrocelos, ocultados sob coloridos panos enrolados à cintura".


E os acidentes, as quedas dos coqueiros, as lesões por armas de fogo, uma lista inenarrável de situações.


E conta histórias, José Pratas é espirituoso, frontal, compassivo, lembra os médicos que morreram em África, caso do João Cantante abatido por um míssil que atingiu a DO em que voava, em 1973.


Como recorda o alferes Ferreira, doente mas inquebrantável em não arredar do seu destacamento a 35 quilómetros da sede do batalhão, percebe-se a emoção e a admiração no relato:


"Quando lá cheguei, nesse manhã cinzenta e aguaceira de Setembro, era preciso transpor um extenso lamaçal onde as botas se inundavam nos charcos povoados de mosquitos e batráquios que abriam o caminho à nossa frente. De um buraco, emergindo do chão, assomou do seu abrigo, emagrecido e frágil, o alferes Ferreira; a expressão sofrida, o brilho lardáceo da pele, o olhar vazio, a barba de vários dias. Apertei-lhe a mão húmida e trémula. Preveniu-me, obstinado:
- Não quero ser evacuado. Ajuda-me a tratar-me. Tenho muito frio e muita sede!


Apesar da minha insistência para o trazer comigo, o Ferreira resistiu aos meus argumentos e aceitou apenas a minha prescrição: comprimidos para a malária e um litro de soro que eu levava na mala. Permaneci com ele por algum tempo ainda, enquanto éramos observados pela inquietação dos soldados que se interrogavam, intranquilos pela saúde do seu comandante de pelotão.


- O nosso alferes vai ficar bem, disse-lhes na despedida.


Para trás ficou um punhado de homens, ou miúdos crescidos, atascados na sua solidão, no seu silêncio e na sua sorte".»


(2) Mário Beja Santos, 22Jan2015
 

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 BCav3864 11 Jun72 MDN visita Pirada

BCav3864 Pirada 1972


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O livro foi apresentado no dia 24 de Outubro de 2014 no salão nobre da CSC-ASMECL

 

As imagens no sítio - http://www.clinicasaocristovao.pt/noticias_detalhe.php?id=59 

(para as visualizar com melhor resolução clique em cada uma delas)

 

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