«Qual a razão que teria levado
o Presidente da Câmara e 50 Membros
da Assembleia Municipal de Ponte de
Lima a rejeitarem a
institucionalização de um dia
comemorativo do sacrifício dos
Limianos que perderam a vida em
defesa de Portugal, ao longo da
História Pátria?»

título: "História do Dia do
Combatente Limiano"
autor: Mário Leitão
editor: Autor
design: Ricardo Rodrigues
execução gráfica: Gráfica da
Graciosa, Lda, Ponte de Lima
edição: Junho 2017
depósito legal: 427328/17
ISBN: 978-989-20-7621-8
PREFÁCIO
"Esquecer os nossos mortos é o
mesmo que matá-los uma segunda vez"
-Elie Wiesel-
Tal como Mário Leitão que, um dia,
ao ouvir a lancinante dor de uma mãe
por não poder fazer o luto do filho
que morreu em combate no Ultramar,
onde ficou sepultado, também a minha
vida mudou no dia em que soube que
um jovem da minha terra havia
tombado pela Pátria, em 1917, na
batalha de La Lys, e que jazia
esquecido no cemitério francês de
Richebourg L'Avoué, no norte de
França.
Nesse verão, peguei no meu automóvel
e percorri mais de 4 mil quilómetros
à sua procura. Quando o encontrei
(no Talhão A, Fila 10, Coval 13),
pus-me em sentido à sua frente e
benzi-me. Depois, baixei-me e
abracei a sua lápide. Chorei e
pedi-lhe desculpa, em nome de todos
os habitantes da minha freguesia,
por o termos esqueci-do durante 96
anos. Fui tarde, mas ainda fui a
tempo de lhe dizer: "Não te deixamos
ficar para trás!". E, quando à
noite, voltei ao hotel a Lille,
sentia-me outra pessoa, com o
sentimento de um dever cumprido, mas
essencialmente feliz e livre.
A Primeira Guerra Mundial e a Guerra
Colonial, como todos os conflitos
similares, têm imensas
características em comum. Em ambas
as circunstâncias, foram mobilizados
para a frente de combate milhares de
jovens portugueses de tenra idade e
verdes sonhos. Com apenas vinte
anos! Na "flor da vida", como é
costume dizer-se. Na "chama exacta
da terna juventude", como dizia
André Breton. Com vinte anos
deixaram o lar, a família, os
amigos, a terra... Alguns nunca
tinham saído das "berças", nem
andado de comboio, nem nunca tinham
visto o mar. De repente, viram-se
despejados no meio da neve da
Flandres e do tórrido calor de
África. No meio da guerra!
Deixaram famílias, mães em pranto,
paixões e amores adiados, vidas,
projectos e sonhos interrompidos,
amigos suspensos.... E uma Pátria
inteira suspensa pela incerteza do
regresso.
Em cada um destes referidos
conflitos, pereceram no campo de
batalha cerca de 10 mil jovens
portugueses. Outros milhares
voltaram estropiados e um sem número
de outros afectados pelos efeitos da
guerra. São factos que não podemos
negar, nem branquear e, muito menos,
esquecer. Porque se há gente que
deve merecer todo o nosso respeito e
reverência, são todos os portugueses
que, ao longo da nossa Historia,
pegaram em armas para lutar pela
Pátria.
Conheço o meu especial amigo Mário
Leitão há muitos anos. Admiro a sua
nobre-za de carácter, a sua leal e
solidária amizade e a sua rara
capacidade de realizar tudo aquilo
em que se envolve. É um homem de
causas, melhor dito de grandes
causas. Abraçou esta com grande
paixão e sentido de dever.
Acompanhei-o, amiúdes vezes a
Lisboa, ao Arquivo Militar e ao
Museu Militar, onde passamos horas a
retirar o "manto do esquecimento" do
rosto de centenas de combatentes por
entre o pó dos milhões de documentos
que os arquivos de Cheias ede Santa
Apolónia religiosamente guardam.
Comunguei do seu tormento e
desassossego, relativamente à
insensibilidade e à indiferença de
alguns poderes, no que diz respeito
a esta sagrada matéria. Ensinou-me a
não baixar os braços e a recusar a
rendição até que seja feita total
justiça a estes homens que "a lei da
morte libertou", mas que o nosso
esquecimento não pode "voltar a
matar". Porque desditosa é a Pátria
que não honra os seus heróis e
ingratos os homens que deles se
esquecem.
A luta que o Mário Leitão vem
travando, juntamente com outros
valorosos conterrâneos e nobres
instituições limianas, pelo
reconhecimento e pela afirmação do
"Dia do Combatente Limiano", para
além de um urgente acto de justiça,
é uma reposição, um retomar do
grandioso gesto de generosidade de
que o Município de Ponte de Lima foi
pioneiro, a nível nacional, em 1996,
ao perpetuar na muralha da Torre da
Pólvora, o nome dos seus filhos que
tombaram na Guerra do Ultramar.
Por isso, hoje, é cada vez mais
imperioso estar do lado desta
valorosa e abnegada gente, em
permanente alerta, neste combate
pela reparação dos danos causados na
dignidade destes combatentes. Não
podemos permitir que estes nossos
heróis "fiquem para trás", nem
consentir que sejam "mortos duas
vezes". Temos de continuar esta
luta, até que esta nobre gente seja
retirada do esquecimento, resgatada
da indiferença e devolvida à nossa
memória. Só depois disso,
conseguiremos virar as costas a esse
tormento, readquirir o sossego e
voltar, de novo, a ser livres.
Porque, como dizia D. António
Ferreira Gomes, ilustre e saudoso
Bispo do Porto, "a minha dignidade é
a minha liberdade".
Obrigado, Mário Leitão. Não estás só
nesta batalha. Continuamos contigo.
Esposende, Maio de 2017
Luís Gonzaga Cantinho de Almeida
Coronel da Guarda Nacional
Republicana (na situação de
reserva).
INTRODUÇÃO
Também eu pertenço ao grupo daqueles
que, por comodismo ou distração,
estiveram durante décadas alheados
das homenagens que são devidas aos
Heróis que tombaram na Guerra do
Ultramar. E certo que a minha
motivação e nostalgia por essa
temática nunca se apagaram desde que
regressei de Angola em Outubro de
1973, mas também é verdade que as
vicissitudes da minha vida relegaram
essas recordações para segundo
plano. Só a partir de 2010 comecei a
recolher as memórias guerreiras dos
meus conterrâneos, primeiro
timidamente, mas depois de um modo
mais sistemático.
Em Julho de 2013 foi convidado para
fazer parte da Comissão Ad Hoc que
celebraria o Dia do Combatente
Limiano em 24 de Agosto desse ano.
Essa foi a segunda vez que o
Município de Ponte de Lima
homenageou os seus filhos caídos em
combate na Guerra do Ultramar, pois
a primeira acontecera em 27 de Julho
de 1996 aquando da inauguração da
lápide comemorativa existente na
muralha da Torre da Pólvora, na
Praça da República, ao fundo da
Avenida António Feijó.
No ano seguinte, a convite do Dr.
José Pereira Fernandes, director da
Revista LIMIANA,
escrevi uma pequena biografia dos
nossos conterrâneos falecidos na
Guerra Colonial (anexo 1),
ficando a partir desse ano
verdadeiramente abraçado a essa
causa, que se vem celebrando
anualmente na Vila de Ponte de Lima.
Deixar registo histórico dos
soldados que morrem em combate é uma
realidade transversal a todas as
civilizações, a todas as sociedades
humanas e a todos os regimes
políticos. Não podem existir
opiniões contrárias a esta
necessidade que as comunidades têm
de erigir monumentos em memória dos
cidadãos que perderam a vida nas
guerras encetadas para sua defesa!
Quem porventura tiver essa opinião,
comete um crime de lesa-Patria, de
lesa-Cultura e de lesa-Sociedade! A
exaltação dos mártires das nações em
guerra, a perpetuação das suas
memórias e a celebração periódica
dos que caíram no campo da honra são
inquestionáveis em todos os países
do mundo, que se empenham em
glorificá-los através de toponímias,
da literatura e do património
arquitectónico.
Infelizmente, o poder político que
se instalou em Portugal a seguir a
Revolução de Abril demorou muitos
anos a compreender esse imperativo
nacional, por razões partidárias,
complexos de culpa,
irresponsabilidade, falta de
coragem, quebra do fervor patriótico
e outras razões. Dessa omissão
resultou que só em 1986 surgisse o
primeiro município a celebrar a
memória dos seus filhos mortos ao
serviço da Pátria em territórios
ultramarinos, honra que coube ao
Concelho de Ponte de Lima.
Paralelamente, mas em sentido
inverso, decorreram cem anos sem que
este mesmo Município fizesse alguma
coisa pela memória dos seus vinte e
sete soldados que morreram durante a
Primeira Grande Guerra, vinte dos
quais foram em boa hora retirados da
escuridão do passado graças ao
trabalho do Dr. Luís Dantas (anexo
2). Na terceira homenagem aos
Combatentes Limianos, realizada em
24 de Agosto de 2014, tive
oportunidade de solicitar
publicamente ao Presidente da Câmara
que
mandasse colocar uma segunda lápide
na muralha da Torre da Pólvora, para
perpetuar a memória dessas Heróis e
Mártires conterrâneos caídos na
Flandres e em Moçambique.
Prestes a terminar o seu mandato, o
Eng.° Vítor Mendes ainda não
satisfez o meu pedido.
Este livrinho é um grito de
protesto! E o meu grito, o grito dos
familiares dos 79 Soldados Limianos
que perderam a vida pela Pátria
durante o século vinte e o grito dos
próprios Heróis, que reclamam o
direito à imortalidade!
Oxalá a população limiana possa
ouvir este clamor!