Trabalhos, textos sobre a Guerra do
Ultramar ou livros
Elementos cedidos
por um colaborador do
portal UTW
Nuno Castro
Nasceu em 1979. Jornalista desde 2003,
começou na revista 'Doze'; colaborou na 'Grande
Reportagem', 'Notícias Sábado', 'Visão' e 'Sábado'; foi
editor na 'FHM' e no diário 'i', onde fez parte da
equipa fundadora. Em 2012 residia em Houston (EUA), onde
fazia um mestrado.
"Heróis do Ultramar", é o seu primeiro livro.
O livro:
"Heróis do Ultramar -
Histórias de bravura nos campos de batalha da Guerra
Colonial"
título: "Heróis do Ultramar - Histórias
de bravura nos campos de batalha da Guerra Colonial"
autor: Nuno Castro
editor: Oficina do Livro
1ªed. Lisboa, 05Set2012
192 págs (ilustrado)
pvp: 14 €
dep.leg: PT-346790/12
ISBN: 989-556-008-0
Apresentação:
- «Uma Homenagem a toda a Geração
submetida ao maior dos sacrifícios: o da Guerra. Uma
grande lição de coragem para todos os Portugueses.
Testemunhos dos intervenientes, cruzando-os, sempre que
possível, com informação existente sobre os episódios.»
Sinopse:
- «Entre 1961 e 1974, centenas de
milhares de portugueses combateram em Angola, em
Moçambique e na Guiné. Mas, como acontece em todos os
conflitos, só alguns combatentes se destacaram.
"Heróis do Ultramar" traça o retrato de um punhado de
homens que se distinguiram nos campos de batalha da
Guerra Colonial e que ainda hoje são recordados pela sua
bravura extrema.
Portugueses que, independentemente do curso da História,
da política ditada pelo Governo de Lisboa, das suas
próprias convicções e até das suas personalidades por
vezes polémicas, demonstraram uma extraordinária
capacidade de liderança debaixo de fogo e uma
determinação inabalável perante a adversidade e o terror
que só uma guerra consegue despertar.
Escrito a partir de vários testemunhos e das memórias
dos combatentes, "Heróis do Ultramar" reúne alguns dos
episódios mais ousados e dramáticos das três frentes do
conflito português em África, na perspectiva dos seus
principais protagonistas no terreno.»
Recensão: - «Heróis, como os representar? Os actos de
heroísmo podem parecer associados a destemor, a lances
de audácia, a abnegação, à entrega da própria vida para
salvar a de camaradas; noutra vertente, poderá ser
encarado como herói o prisioneiro que não renega nem
trai; há também o herói amaldiçoado, pois praticou uma
façanha calcando certas orientações, sendo por isso
punido. Associa-se o campo de batalha à prática de
façanhas, correr em direcção ao inimigo, mas um
comandante ferido pode igualmente galvanizar os seus
homens, pondo a sua vida em risco. Enfim, há múltiplas
facetas para definir os actos de heroísmo e a galeria
dos heróis tem diferentes predicados, sujeitos e
complementos directos.
"Heróis do Ultramar, Histórias de bravura nos campos de
batalha da guerra colonial", é uma colectânea de
testemunhos que nos remetem para a complexidade do
herói. O autor foi cuidadoso em abrir a paleta de cores
à multiplicidade dos actos: o herói mal-amado, o herói
incómodo, o herói secundário; o herói lendário, sobre o
qual circulam rumores de poderes sobrenaturais; o herói
resistente, inquebrantável, que obriga o inimigo a
retirar ou a pagar muito caro o seu denodo atacante; o
herói de sangue azul; o herói que nunca foi esquecido
pelos subordinados. O livro regista esses diferentes
momentos de superação individual e inclui mesmo o caso
de heróis civis como os de Mucaba.
Nuno Castro é um autor humilde, apaga-se perante o vulto
de qualquer herói, não gosta da guerra mas se tivesse
que a fazer gostaria de estar ao lado destes heróis.
Na impossibilidade de se registarem todos os
testemunhos, vamos circunstanciá-los à galeria dos
heróis guineenses.
Excerto do livro:
Para visualização do
conteúdo clique no sublinhado que se segue:
(...) De louvor em louvor, a reputação de
Marcelino foi crescendo-
E a lenda também. (...)
Primeiro, o tenente-coronel Marcelino da Mata, o mais
condecorado dos heróis. Apesar de ter participado num
número inenarrável de operações, nunca foi ferido pelo
inimigo. No regresso a um quartel depois de uma missão,
confundiram-no com um guerrilheiro e foi alvejado por um
companheiro. Num desastre em Farim, a viatura onde
seguia despistou-se, andou aos tombos, puseram-lhe metal
num braço. Era jovem e pensou aliar-se aos rebeldes,
estes terão exercido represálias por ele estar no
Exército português e fuzilaram-lhe o pai e uma irmã.
Escolheu o lado português. Quem o conheceu no teatro de
operações, não esconde a admiração pelo seu desembaraço,
a maneira afoita como torneava todos os obstáculos.
Ganhou a sua primeira cruz de guerra na operação
Tridente e a Torre e Espada por ter resgatado a CCAÇ
1546, que fora apanhada pelo PAIGC. Sempre que precisava
de obter informações, disfarçava-se, punha a farda do
PAIGC e uma bolsa de enfermeiro, representava o papel na
perfeição e entretanto fixava onde se posicionava o
inimigo. Horas depois voltava com o seu grupo e
malhava-lhes. Irá recendendo sucessivas condecorações
até ao fim da guerra. Veio para Portugal, por alegadas
ligações ao ELP, foi preso e interrogado. Fugiu para
Espanha e regressou depois do 25 de Novembro. É
deficiente das Forças Armadas. Fez alguns biscates como
segurança e voltou duas vezes à Guiné clandestinamente.
Há quem lhe chame o Rambo da Guiné.
António Júlio Rosa chegou à Guiné em finais de 1967, foi
colocado na região de Tite. Coube-lhe a responsabilidade
de voltar a tentar ocupar Bissássema, uma base logística
importante para a guerrilha. Começaram por cavar valas,
cortaram troncos para proteger a parte superior dos seus
abrigos. E de repente, durante a noite, foi despertado
por rajadas de metralhadora, os guerrilheiros tinham
entrada em Bissássema. No dia 3 de Fevereiro de 1968,
aos 21 anos o alferes Rosa caiu nas mãos do inimigo. Tal
como o sargento Lobato, 5 anos antes, vai caminhar dias
a fio, conduzido por homens armados. Em Boké será
interrogado por Nino Vieira, em Conacri levado à
presença de Amílcar Cabral. Na prisão de Kindia, irá
ensaiar com António Lobato uma fuga, andarão seis dias a
monte. Em Novembro de 1970, será libertado durante a
operação Mar Verde. Esse ano já passou o Natal em casa e
conheceu o irmão que nascera enquanto ele era
prisioneiro do PAIGC. Foi recebido como um herói em
Abrunhosa-a-Velha, a população encheu a estação, houve
foguetes, banda e missa em homenagem ao ex-prisioneiro.
Alípio Tomé Pinto, hoje general na reforma e que anda a
plantar árvores em Maçores, no planalto Mirandês, ficou
conhecido como o "capitão do quadrado". Quando chegou à
Guiné, no comando da CCAÇ 675, já tinha desnorteado a
senhora morte. Fora alvejado numa patrulha a São José do
Enconge, no coração dos Dembos, em Angola. A bala
atravessou o maxilar e alojou-se junto à carótida.
Foi-lhe administrada a extrema-unção mas recuperou.
A lenda de Tomé Pinto, também conhecido pelo capitão de
Binta, começa com os primeiros trinta dias em que chegou
ao aquartelamento e se pôs a patrulhar toda a região, os
guerrilheiros cultivavam à volta de Binta,
aproveitavam-se do temor da tropa que anteriormente ali
estivera. Há já obras publicadas sobre esta CCAÇ 675, um
então furriel enfermeiro escreveu sobre o primeiro ano
de actividade desta companhia, é o caso inédito de um
diário com olhar colectivo publicado em tempo
praticamente real. O capitão do quadrado voltará a ser
ferido em combate e o cronista destes acontecimentos
escreverá com imensa ternura, como sopesasse a dor
colectiva: "Todos queriam pegar na maca para o
transportar; um despia o casaco camuflado para lhe
aconchegar melhor a cabeça; outro dava-lhe o seu
concentrado de frutos da ração de combate; outro ainda
quase que o obrigava a beber água do seu cantil".
Regressará a Binta semanas depois e lança-se na
actividade operacional. Abandonará a companhia para
fazer o curso do Estado-Maior do Exército. O seu
sucessor desabafará: "Envergonho-me de comandar os
homens de Tomé Pinto. No meio deles, sinto-me um
soldado, pois eles não precisam de ordens, nem as
esperam. Têm tal conhecimento da zona, tal sentido de
orientação e tal intuição do perigo que se movem
ordeiramente para qualquer lado". Tomé Pinto chegara a
Binta a 29 de Junho de 1964 e no relatório de 24 de
Dezembro já registavam 51 acções de fogo sobre o seu
comando.
Há heróis em todos os escalões militares. Como escreve
Nuno Castro, há até heróis que se rendem, isto a
propósito de um episódio que envolveu a 1ª companhia do
BCAV 8421, em Moçambique.
Em certas conjunturas, há heróis tão incómodos que é
preferível não falar deles. A lista dos heróis não é
inesgotável, mas convém não esquecer que durante a
guerra colonial houve cerca de 2 mil condecorações só
com a Cruz de Guerra.
O autor fez uma escolha de tipos de heróis, escolheu-os
pela bravura extrema, pela liderança carismática, pela
capacidade de sofrer sem trair.
Podia ter ido mais longe? Convém recordar que com
regularidade estão a ser publicadas obras com uma grande
versatilidade de testemunhos. Há imensos filões para
explorar.
Há muitos heróis para dar a conhecer, haja confiança e
vontade de os desvelar à opinião pública.»
("Histórias de bravura nos campos de batalha na guerra
colonial"; in Blogue de Notas, Bruno Oliveira Santos,
05Nov2012)