"Guerra,
Paz e Fuzilamentos dos Guerreiros;
Guiné 1970-1980"
Mais uma obra da
longa série de Manuel Bernardo sobre a nossa história
contemporânea.
Foi lançado em 29 Nov 07, ao fim da tarde, nas
instalações da Sociedade Histórica da Independência de
Portugal (S. H. I. P.).
A apresentação esteve a cargo do General Ferreira Durão,
que também prefaciou.
O Salão Nobre do Palácio da Independência esteve quase
repleto, como vem sendo normal nos lançamentos
deste Autor.
Parabéns por mais um nascituro, duma série já longa (ver
o Cap. “Crítica”), e designadamente pela persistência da
reposição duma Verdade maiúscula, mesmo quando alguns
interesses tentam, ou conseguem, escamoteá-la.
Je
PREFÁCIO
Embora
resistindo, acabei por ceder em elaborar este prefácio.
A isso me
obriguei pela amizade que me liga a Manuel Bernardo, e
também por reconhecer a sua insistência em procurar,
intervenção após intervenção, clarear uma verdade que
persistentemente tem sido deturpada. Repetindo-se
continuamente uma versão, considerada "culturalmente
correcta", que pretende ocultar períodos de insofismável
valor, antes enaltecendo períodos de acentuada
mediocridade onde se fomentou uma quase global
indisciplina, confusão e despudorada manipulação, que
puseram em risco mais que a liberdade pretendida, a
própria existência do País. Tenta-se fazer esquecer,
omitir ou apagar uma verdadeira epopeia. Em síntese
pode-se mesmo afirmar que foi um dos feitos mais
notáveis da História de Portugal. Basta só analisar
como, durante 13 anos, um milhão de portugueses
resistiram nas condições muito difíceis em que o
conseguiram. A intenção é vilipendiar o que foi uma
epopeia, porque o que se passou depois foi uma vergonha,
é a esta comparação a que se quer fugir.
Em 25 de Abril de
1974, um golpe militar derrubava um regime autoritário,
e além disso, esgotado e já sem capacidade de soluções
adequadas, sobretudo face a uma guerra que se prolongava
sem fim e até sem objectivos definidos.
Saudar esta data será saudável, mas veio a acontecer
que se ficou por aí. Em breve se verificou um vazio, não
surgiu nenhum projecto credível, impedindo-se até uma
liderança consequente.
Ficámos nas festividades, distraídos, levando tempo
a perceber o abismo para que caminhávamos; houve
irresponsabilidade, mediocridade, imaturidade, mas
também traição. Felizmente restavam ainda alguns valores
que permitiram travar, em 25 de Novembro de 1975, a
catástrofe que se avizinhava.
O MFA acabou por se tornar agente de indisciplina
quase generalizada, pretendendo, a determinada altura,
capturar o poder, fazendo-se passar por legítimo
representante das Forças Armadas (FA), o que, de facto,
não o era, como posteriormente se veio a provar,
acabando por não acontecer, por se conseguir impedir a
implantação de um sistema político militarista e
totalitário.
A realidade é que se as FA deram 13 anos para que
fossem tomadas adequadas soluções políticas, o MFA não
deu um minuto...
Mas afinal que
tem a ver esta abordagem com o que se narra neste livro
de Manuel Bernardo? Tem muito; foi precisamente neste
contexto histórico que desembocou um esforço de
resistência do mais elevado mérito por parte de uma
geração. É curioso ser consensual considerar-se uma
epopeia, uma época histórica de ouro, as viagens
marítimas, o período dos Descobrimentos. Mas qual seria
a consequência de um tal empreendimento, dessa expansão,
se não a formação de um Império? Como culturalmente se
não liga um facto ao outro?
Portugal é
muito mais do que salazarismo e abrilismo; cingirmo-nos
permanentemente a essa polémica é culturalmente muito
redutor.
Na realidade foi o destino que penetrou
profundamente na cultura portuguesa. Durante séculos se
foi formando e consolidando esse Império, nos séculos
XV, XVI, XVII, XVIII, XIX e XX.
Muito antes de nós Afonso Costa afirmava:
"Portugal não é um pequeno país. Os que sustentam isso
esquecem as províncias ultramarinas, que fazem, com o
território metropolitano de Portugal um todo uno e
indivisível. E sobre o português basta recordar o
passado que, longe de ser um motivo para nada fazermos,
deve constituir uma obrigação imperativa para agirmos".
..."Malhas que o Império tece"...
Com efeito
chegados a 15 de Março de 1961 e desencadeada, em
Angola, a onda de barbárie que constituiu o acto mais
cruento da história do terrorismo, gerou-se o mais
profundo repúdio popular, uma onda que percorreu o País,
uma dinâmica de intervenção necessária e imediata. Só
nos restava uma atitude a tomar: agir!
Foram períodos exaltantes, sendo disso o reflexo que
permanece e se manterá enquanto vivermos, por termos
compartilhado sacrifícios, dificuldades, alegrias e
tristezas, a mais pura camaradagem com essa gesta,
lídima representante do Povo, os soldados.
E assim foi; partimos no cumprimento do Dever para
Angola, para a Guiné, para Moçambique e por aí fora...
Foi até espantoso, após a selvajaria de 15 de Março
de 1961, que a doutrina militar imposta fosse a defesa,
a recuperação, o desenvolvimento e a conquista das
populações que foi realizada com rigor e sucesso.
Ultrapassámos todas as previsões e resistimos
durante treze anos, tendo acabado por sermos derrotados,
não pelo inimigo mas por nós próprios...
Os "ventos da história" tinham chegado até nós.
O que eram os
"ventos da história"?
Finda a guerra de 1939/45, emergiram duas grandes
potências: os Estados Unidos e a União Soviética, ambas
com apetência de influência global. Mas uma terceira
potência iria surgir, quando recuperada das feridas
dessa guerra. O mundo a três seria complicado. Melhor a
dois, e então aproveitando-se anseios dispersos de
autodeterminação e independência, os EUA e a URSS
apoiaram, dinamizaram e até empolaram, directa ou
indirectamente os movimentos emancipalistas, e
conseguiram que a Europa perdesse a presença e
influência em África, Ásia, etc.
Isto foram os "ventos da história", o propalado
anti-imperialismo e anticolonialismo. No entanto,
realizado de forma abrupta e rápida, em ruptura,
abandonando à completa desprotecção, e às carências mais
diversas, imensas massas populacionais.
O livro de Manuel
Bernardo narra, através de diversos testemunhos, a
guerra da Guiné. Foi um dos teatros de guerra onde,
porventura, a luta foi mais intensa e dura; contudo, em
todo o momento podíamos, desde que, com o planeamento
adequado e os efectivos necessários, estar presentes em
qualquer ponto do território, o que não podia ser
conseguido pelo inimigo. Isto não origina que o esforço
militar se pudesse prolongar indefinidamente; havia que
procurar solução política, inteligente e condigna, que
não foi tentada atempadamente.
Acabou por se criar uma situação, onde se desencadeou
uma completa e insustentável indisciplina, cujos agentes
foram os mais diversos, escrevendo-se uma das páginas
mais negras da nossa História
Desprezámos apressadamente populações indefesas; não
terminámos a guerra em África, abandonámos a guerra em
África! E não só em territórios onde havia guerra... Mas
isto é outra História...
Frequentemente,
arautos da desgraça, pseudo intelectuais e
historiadores, agentes de interesses obscuros, propalam
dislates, através dos mais diversos meios, que até
parecem doutrina oficial, como tal ao serviço de um
"culturalmente correcto".
Enunciarei e
rebaterei alguns:
1 -"Em 1961 cometemos o erro de nos
empenharmos numa guerra em África", glosando-se o
conceito de que "Portugal fosse do Minho a Timor".
Tal conceito nem
sequer é expresso na nossa geração, vem do passado, é
uma herança. O que significa, como já citei, considerar
que "...o território metropolitano e as províncias
ultramarinas constituem uma Nação una e indivisível...",
segundo Afonso Costa, ou que "...o Império é
intocável..." como afirmava Norton de Matos? Não era o
do “Minho a Timor”?
Foi um destino, mesmo uma estratégia nacional. As
viagens marítimas, os descobrimentos, a expansão
portuguesa, a consequente construção de um Império, não
é isto mesmo que Camões canta nos Lusíadas?
Como era possível, face à barbárie desencadeada em
15 de Março de 1961, em Angola, não reagir com o
empenhamento militar?
Enaltecem-se os desertores que constituem uma ínfima
percentagem. Podem dividir-se em três grupos: os
objectores de consciência, a menor parte, os por
comodidade e os por covardia, a maior parte; alguns até
em conluio com o inimigo; "...também dos portugueses
alguns traidores houve algumas vezes...".
2 - "Os soldados portugueses partiam
para África sem saber porquê e para quê".
Esta atoarda é
até ofensiva. Quem os comandou sabe que é facilmente
desmentida. Sem me alongar, apenas pergunto, como foi
possível que se batessem durante 13 anos com o valor e
dignidade com que o fizeram? Ou trata-se de gente parva?
Sabiam muito bem que actuavam em território
nacional e cumpriam o seu Dever.
Só quem não os comandou é que não sabe a
determinação, o espírito de missão e a enorme
compenetração no cumprimento do dever.
Menos compreenderam, os de uma geração anterior,
porque se bateram em França, durante um ano, embora
dentro da mesma estratégia da defesa do Império, que na
sua mente tal lhes escapava, aí sofrendo, nesse ano,
dificuldades, sacrifícios e até baixas, em percentagem,
muito superiores aos 13 anos da guerra do Ultramar.
3 - "As FA cometeram em África
horríveis massacres, saques e outras barbaridades".
Em qualquer grupo
humano existem bandidos e criminosos. Não é preciso
estar em guerra; mesmo em paz, basta ler os jornais para
constatarmos quantos crimes e barbaridades acontecem por
esse mundo fora. Cair em generalizações é mentir
descaradamente. Por vezes até é cair no ridículo.
Já ouvi um desses idiotas, recentemente, em plena
televisão, narrar que, enquanto se procedia à evacuação
de mortos e feridos causados pelo rebentamento de uma
mina, alguns militares enterraram uma pobre mulher viva,
no buraco resultante da explosão, ficando apenas com a
cabeça de fora. A imaginação tem limites, a cratera de
uma mina não ultrapassa dois palmos de profundidade...
A missão prioritária e bem determinada das FA era, a
par da neutralização dos grupos inimigos, a conquista
das populações. Como é possível que procedessem
contrariamente?
Em contrapartida, numa guerra como a que travámos, o
inimigo face ao nosso sucesso de conquista da população,
embora a sua propaganda diga o contrário, comete
massacres indeterminados, endurece a acção armada,
vitimando a própria população, para a atemorizar. É que
as FA têm leis, mas o guerrilheiro ou rebelde não a tem.
Falar de imaginários massacres, cometidos pelas FA,
é ostensivamente querer ocultar os mais diversos
cometidos pelo inimigo, sobretudo o que foi praticado em
15 de Março de 1961 no norte de Angola, um acto de
terrorismo bárbaro e inqualificável. Por sinal inspirado
e minuciosamente planeado por um intelectual,
revolucionário e autor de livros, em especial sobre a
guerra da Argélia, Franz Fannon, conselheiro de Holden
Roberto para o efeito.
4 - "A guerra arrastava Portugal para
um colapso económico".
Nesse período
verificou-se um enorme desenvolvimento. É público que na
década de 60, em plena guerra, o índice de
desenvolvimento se aproximou dos 8 %, decaindo desde
então.
5 - "A guerra estava perdida".
É não querer
compreender que estas guerras não se ganham nem se
perdem, sobretudo quando se desencadeiam tantos
interesses internacionais, como foi o caso.
Há que se aproveitar o esforço e a superioridade
militar e que o poder político encete medidas dignas e
honrosas para ambas as partes e no verdadeiro interesse
das populações envolvidas.
As FA não são culpadas de não se terem realizado
soluções políticas. Por sinal elas foram tentadas, na
Guiné, mas acabaram por serem impedidas pelo poder
político.
Tínhamos superioridade militar e conquistado a
maioria das populações; podíamos operar em qualquer
ponto do território, o que não acontecia com o inimigo.
Quando iniciei a minha primeira comissão na Guiné,
fiquei muito surpreendido pela nossa própria
terminologia (talvez um devaneio de Estado Maior), de
"zonas sob nosso controlo e zonas sob controlo do
inimigo". Seria possível? Verifiquei, por experiência
própria, que apenas havia zonas onde não encontrava o
inimigo e outras onde o encontrava.
Quando foi retirada uma unidade de quadrícula de
Madina do Boé, tal aconteceu pela simples razão de que
lá nada estava a fazer, a não ser servir de alvo para o
treino de tiro pelo PAIGC, que periodicamente a
flagelava de posições colocadas para além da fronteira.
O Boé era uma região sem população e sem instalações
inimigas no seu interior, pelo que qualquer actividade
operacional ou de contacto com populações, por parte
dessa unidade, seria inócua. A situação no Boé continuou
a ser a mesma. A propagandeada cerimónia de
independência pelo PAIGC, em Madina do Boé, e
reconhecida por diversos países, poderia ter aí
decorrido ou em qualquer outro sítio; o folclore seria o
mesmo, bem como os seus efeitos. Dizer que o Boé estava
sob controlo inimigo, é esquecer que em Angola e
Moçambique havia zonas muito maiores onde não existia
nenhuma unidade de quadrícula, sendo aquela área bem
menor que a de qualquer distrito de Portugal.
Ainda sobre o complexo da "guerra perdida": o que
teriam pensado os militares duma geração anterior, que
combateram em França, sofrendo maiores sacrifícios e
baixas, existindo também um caos na retaguarda que
chegou mesmo ao seu abandono? Que a guerra estava
perdida?
A verdade é que desfilaram em Paris, festejando a
vitória.
6 - "O 25 de Abril aconteceu porque
as FA não queriam mais combater em África".
É espantoso que
até alguns militares abrilistas façam coro com tal
argumento, bem como se ficou a dever também aos
movimentos de emancipação. Fico confuso. O MFA teria
alguma ligação ou inspiração no MPLA, FRELIMO ou
PAIGC?
É até um enxovalho ao movimento militar de 25 de
Abril. Eu sempre pensei que, em 25 de Abril, uma acção
militar pretendeu pôr fim a um sistema político
opressivo e autoritário, devolvendo ao povo a Liberdade
e um sistema político democrático.
As FA não queriam combater?
Basta de argumentos pejorativos e insultuosos.
Apesar de todas
as dificuldades, o que as Forças Armadas fizeram ao
longo dos treze anos de campanha, só foi possível pelo
esforço conjugado de defesa e desenvolvimento, pela
articulação das vontades das autoridades empenhadas dos
territórios em luta, pela fidelidade da maioria das
populações, que permaneceram ao nosso lado e, sobretudo,
pela qualidade do nosso soldado que, na sua rusticidade,
simplicidade e humanidade, suportou extremos
sacrifícios, e se bateu sempre com grande dignidade e
valor.
São merecedores
do maior destaque aqueles que constituíram a maior parte
das forças empenhadas, que junto das populações as
defendiam, intervindo operacionalmente, conforme a sua
capacidade, no sector que lhes era atribuído. Refiro-me
às pouco mediáticas forças de quadrícula que, com
permanente sacrifício e privações, ocupavam o
território, consolidando a nossa presença e um constante
contacto com as populações.
Destaco também as forças de intervenção ou
especiais, que pontualmente intervinham, ampliando a
acção das forças de quadrícula, com grande eficácia e
valor - conforme se constata em diversas passagens deste
livro -, dada a sua preparação e meios atribuídos.
Não esqueço os operadores dos meios aéreos e navais,
que, em acções conjuntas, eram indispensáveis, bem como
no apoio logístico, revelando elevado espírito de
colaboração e missão.
Relembro também, com grande admiração e gratidão,
essas mulheres que constituíram o Corpo de Enfermeiras
Pára-quedistas, exemplo para todos nós do mais elevado
valor militar, humanidade e sentido do Dever.
Sonhei que a
Epopeia Portuguesa: as viagens marítimas, a expansão, a
construção e defesa de um Império, teria por fim a
formação de Nações autónomas e independentes, com
condições para o exercício da liberdade e do progresso
dos respectivos Povos. Mas o sonho terminou em pesadelo,
porque o fim foi uma tragédia, uma fuga apressada,
abandonando-se sem o mínimo respeito populações; ia
dizer à sua sorte, mas, na verdade, ao seu azar. Uma
autêntica descolonização "especial de corrida".
Também tenho direito ao meu "stress pós-traumático",
que será irreversível, porque virei a morrer como um
português envergonhado...
Resta-me o
orgulho de poder expressar aos meus soldados:
Camaradas, a guerra foi longa e dura.
Combatestes com coragem e brio pela vossa Pátria.
Sois um grupo especial
Descobristes, uns nos outros, uma ligação
Que só em combate existe
Entre irmãos
Em perigos partilhados
Cada um apoiou o outro em momentos difíceis.
Vistes a morte e sofrestes juntos.
Orgulho-me de ter servido com todos e cada um de vós.
Faltam alguns... para eles vai a nossa saudade.
Mereceis uma longa vida em paz e felicidade.
Se um neto vos vier a perguntar:
Avô, foste um herói na guerra?
Respondei:
Não!
Mas pertenci a uma companhia de heróis!
Uma última palavra
para Manuel Bernardo. Bem-haja pela sua persistência no
registo de elementos indispensáveis à compreensão de um
período de grande importância histórica.
General Ricardo
Durão
Destaques de contra-capa
Do Prefácio:
(…) O livro de Manuel Bernardo narra, através de
diversos testemunhos, a guerra da Guiné. Foi um dos
teatros onde, porventura, a luta foi mais intensa e
dura; contudo, em todo o momento podíamos, desde que com
o planeamento adequado e os efectivos necessários, estar
presentes em qualquer ponto do território, o que não
podia ser conseguido pelo inimigo. Isto não origina que
o esforço militar se pudesse prolongar indefinidamente;
havia que procurar solução política, inteligente e
condigna, que não foi tentada atempadamente. (…)
General Ricardo
Durão
(…) Depois de ter
ganho todas aquelas condecorações, incluindo a Torre e
Espada, deixaram-me a vencer apenas como capitão, quando
vejo tipos como o Quinhones de Magalhães
(Nota) e o Mário Tomé,
os mentores da extrema-esquerda e dos que me torturaram
no RALIS (1975), com a carreira reconstruída e
promovidos a coronel. Nem dá para acreditar. (…)
Tenente-Coronel
Graduado Marcelino da Mata
(…) Já se podia
prever, através das leis de justiça militar aprovadas em
Setembro de 1973, pelo PAIGC, que os fuzilamentos
daqueles homens acabariam por se concretizar após a
independência. O que veio mesmo a acontecer,
nomeadamente em relação à grande maioria dos oficiais e
sargentos das forças especiais. (…)
Comandante Alpoim
Calvão
(…) Enquanto o
PAIGC de Nino Vieira, após o golpe de 14 de Novembro de
1980, falava em 500 pessoas executadas nas matas de
Cumeré, Portogole e Mansabá, outras fontes referem-se a
mais de mil indivíduos fuzilados clandestinamente desde
a independência e até àquela altura. (…)
O Autor
 |
 |
Da esquerda
para a direita: Sargento Comando Africano
(guineense) José Monteiro, General Ricardo
Durão (que apresentou a obra), Dr. Lobo do
Amaral, da SHIP e Presidente da Associação
de Comandos, Dr. Nuno de Carvalho da Editora
Prefácio e o autor Manuel Amaro Bernardo. |
Coronel
Casanova Ferreira (sentado) com um grupo de
ex-"Comandos" Africanos da Guiné |
Badana da capa
Manuel Amaro Bernardo,
nascido em Faro, é Coronel do Exército (Infantaria), na
reforma, tendo sido promovido a alferes em 1960.
Cumpriu quatro comissões no Ultramar (Angola e
Moçambique). No 25 de Abril estava colocado na Academia
Militar, onde existia um núcleo importante de oficiais
contestatários ao regime anterior. Liquidando o então
extinto RI 1, encontrava-se no então Regimento de
Comandos, na Amadora e fez parte do Posto de Comando,
que coordenou as acções de contenção ao golpe de 25 de
Novembro de 1975. Desempenhou funções de comando no
Batalhão n.º.2/GNR (1979/85) e foi promotor de justiça e
juiz nos Tribunais Militares de Lisboa (1987/95).
É diplomado com o Curso de Ciências da Informação da
Universidade Católica (1990/93)
Publicou os livros:
Os Comandos no
Eixo da Revolução; Crise Permanente do PREC; Portugal
1975/76 (1977).
Marcelo e Spínola, a Ruptura; as Forças Armadas e a
Imprensa na Queda do Estado Novo; Portugal 1973-74.
(1994 e 2. edição em 1996, Ed. Estampa).
Equívocos e
Realidades - Portugal 1974-75.
(2 volumes 1999).
Combater em
Moçambique – Guerra e Descolonização, 1964-1975
(2003, Ed. Prefácio).
Memórias da
Revolução; Portugal 1974-1975
(2004, Ed. Prefácio).
Em co-autoria publicou: (com o Coronel Morais da
Silva),
Timor – Abandono
e Tragédia (2000,
Ed. Prefácio). Com a coordenação de Manuel Barão da
Cunha,
Os Militares, as
Artes e as Letras; Os 25 Anos do 25 de Novembro
(2001, Ed. Notícias). Com Francisco Proença Garcia e Rui
Domingues da Fonseca,
O 25 de Novembro
de 1975; Os “Comandos” e o Combate pela Liberdade
(2005, Ed. Associação de Comandos).
Lançamento do livro “Guerra,
Paz e …Fuzilamentos dos Guerreiros; Guiné 1970-1980”
De: Manuel Amaro
Bernardo
Agradecimentos:
- Editora
- Prefaciador (General Ricardo Durão
- Presidente da Ass. dos Antigos Comb. Guiné
(Sargento José Monteiro)
- SHIP pela cedência das instalações.
- Amigos e todos os presentes
Em primeiro lugar
desejava informar sobre a identidade dos três principais
comandos africanos, que estão na fotografia da capa, em
frente do General António de Spínola. São: o então
Tenente Adriano Sisseco (depois graduado em Capitão); o
então Furriel Aruna Candé, o porta-guião (depois
graduado em 1.º sargento) e o Alferes Aliú Sada Candé.
Todos estes três comandos africanos seriam fuzilados
pelo PAIGC, depois da independência da Guiné.
Como ireis
entender através da leitura deste livro, além do tema
principal, julgo que razoavelmente bem salientado no
título, trata-se igualmente de acertar contas com um
passado mais ou menos recente.
Deste modo aparecem referências a Zeca Afonso e a
Salgueiro Maia; a Vasco Lourenço, a Almeida Santos e a
Mário Soares; e ao Eng.º Martel de Lima, alvo de um
processo em Tribunal, por me ter difamado na Imprensa,
no ano passado.
Estes aspectos
são devidamente destacados nos capítulos IX e X. E não
me vou debruçar mais sobre tal assunto, estando no
entanto à disposição dos presentes e dos restantes
leitores para qualquer esclarecimento, quer hoje, quer
numa outra altura.
Como é
referido na
Introdução,
a razão da investigação e da publicação deste livro
deveu-se ao facto de ter sido sensibilizado para o
fazer, pelo meu saudoso amigo Coronel José Pais, uns
meses antes de falecer. Por essa razão a obra
encontra-se dedicada, de modo especial, a este meu
camarada de armas pertencente, como outros aqui
presentes, ao meu Curso de Infantaria da Academia
Militar, de 1956/1959. Recordo termos celebrado, no ano
passado, os 50 anos de entrada na vida militar.
Sobre o
conteúdo não vou adiantar mais nada. Lembro o que foi já
referido na pré-publicação feita na revista
Mama
Sume, em Junho
passado, assim como o que sucedeu na cerimónia do
descerramento das duas placas com os nomes de 53
“comandos” fuzilados na Guiné, entre 1974 e 1980, junto
ao Monumento ao Esforço Comando Tal ocorreu no Quartel
da Amadora, no passado 29 de Junho, Dia dos Comandos. Os
nomes estão igualmente neste livro, pois, colaborei com
a Associação de Comandos, na elaboração dessas relações.
Noutro anexo são também relacionados os 98
indivíduos dados como fuzilados clandestinamente e
enterrados em valas comuns, pelo jornal oficial do
PAIGC, naquele período de 1974-80 e depois do golpe
liderado por Nino Vieira, em Novembro de 1980 e que
depôs o então Presidente Luís Cabral.
Num terceiro
anexo é apresentada uma listagem de 96 elementos. entre
cipaios, régulos, milícias e militares, nomeadamente os
das restantes forças especiais (caso dos fuzileiros)
também considerados como fuzilados clandestinamente,
pela Associação Portuguesa dos Antigos Combatentes da
Guiné e pelo livro publicado em 1989, pelo
Tenente-Coronel Queba Sambu, um oficial dissidente do
PAIGC, que, depois, veio a exilar-se no estrangeiro.
Agora, vou
realçar um aspecto destacado pelo Sr. General Ricardo
Durão no seu prefácio, sobre a defesa do Minho a Timor,
feita por Afonso Costa e Norton de Matos, ilustres
maçons do século XX, em Portugal.
Se me
permitem queria lembrar ainda outro activo e versátil
político, Joaquim da Cunha Leal, que, após a saída da
Academia Militar, como Oficial de Engenharia, até
chegaria a ser o Chefe do Governo, na altura da
presidência de António José de Almeida, durante dois
meses; isto, depois ter desempenhado as funções de
Ministro das Finanças e de deputado, após o seu regresso
das trincheiras da Flandres, em 1918.
Acabaria por vir a ser um persistente crítico do Dr.
Salazar. Lembro que, além de outros livros sobre a
política ultramarina, ele escreveu dois sobre o que
sucedia em África em 1961.
O primeiro, posto à venda, em Lisboa, dois dias
antes dos acontecimentos de Luanda, de 4 de Fevereiro
desse ano, intitulava-se “O
Colonialismo dos Anticolonialistas”.
O segundo, com o elucidativo título “A
Gadanha da Morte”,
foi lançado em Agosto desse mesmo ano de 1961; nele, o
autor afirma logo no intróito/prefácio que “em
4 de Fevereiro iniciava-se em Angola uma catástrofe cujo
desenlace só Deus poderá conhecer, por muito grande que
venha a revelar-se o patriotismo e a capacidade de
sacrifício de todos os bons portugueses”.
E mais à frente, comenta e critica a posição do Dr.
Salazar sobre as respostas dadas a um jornalista do “New
York Times” em relação ao que acontecia em todos os
territórios ultramarinos portugueses e nomeadamente em
Angola e ainda sobre o seu discurso feito na Assembleia
Nacional em 30 de Junho de 1961.
Quando chega ao
caso da Guiné, Cunha Leal escreve:
(….) Para redobrar as inquietações
dos bons portugueses sobre a nossa Guiné, lêem-se os
jornais e ouvem-se pela rádio notícias alarmantes, tais
como a que passo a reproduzir do jornal francês “Le
Monde” de 15 de Junho de 1961:
Conakry, 14
de Junho
O Sr. Amílcar
Cabral, secretário-geral do “Partido Africano da
Independência da Guiné Portuguesa”, formulou na
terça-feira em Conakry, um apelo
«a todos os povos amantes da paz» para impedirem
Portugal de desencadear no seu país «uma nova guerra de
extermínio semelhante à registada em Angola (..)
E Cunha Leal
prosseguia:
“
(…) Como se acaba de ver, mais uma vez, vem a talhe de
foice a impertinente e inconcebível tese de que nós, os
portugueses, é que estamos a desencadear uma guerra de
extermínio contra povos africanos. Homens armados com
equipamentos vindos de países comunistas, atacam
inesperadamente, matam e esquartejam os colonizadores
brancos, gabando-se, ainda por cima, das suas sinistras
façanhas, como o fizeram a um correspondente do “Le
Monde”. Isto – repito – é para o sr. Amílcar Cabral,
para os seus colegas de gang e – o que é mais lamentável
– para um grande sector do chamado mundo civilizado uma
operação legítima, senão humanitária. Mas se nós, os
portugueses (…) nos defendemos com unhas e dentes contra
uma agressão injusta e abominável, então passaremos a
praticar uma política de genocídio, o que faz pôr os
cabelos em pé até aos próprios calvos deste mundo
dementado. As coisas que se dizem sem resquícios de
pudor intelectual e moral!”
No entanto, este
texto por ter sido escrito em cima dos acontecimentos de
15 a 18 de Março de 1961, poderá levar os leitores a
serem enganados sobre quem estava por detrás daqueles
quatro dias de terrorismo fanático, que levou aos
assassínios em massa de cerca de 7.200 pessoas, sendo
1.200 brancos e os restantes negros. Grande parte deles
foram praticados com tortura prévia, violações de
mulheres e crianças e muitas mutilações de cadáveres.
Mas tais actos terroristas praticados pela UPA de
Holden Roberto não tiveram o apoio dos soviéticos, mas
sim dos EUA, como se encontra confirmado em vários
trabalhos. Um autor que se tem debruçado sobre Angola
tem sido o historiador Tenente-Coronel Pires Nunes. Tem
um livro também publicado pela editora Prefácio: “Angola
1961; da Baixa do Cassange a Nambuangongo”
Regresso ao
caso da Guiné, para recordar a denúncia em relação aos
fuzilamentos levados a efeito ao longo daqueles seis
anos pós-independência.
Além da notícia dada na Rádio, em 14 – 6 – 1975, por
Otelo Saraiva de Carvalho, sobre o fuzilamento de
“dezenas e dezenas de elementos contra-revolucionários”,
nesse ano, apenas uma revista – o “Jornal
Português de Economia e Finanças”
de Valdez dos Santos, se referiu ao caso
Como saliento
neste trabalho, em 1976, o General António de Spínola,
no seu livro “Ao
Serviço de Portugal”,
referia-se ao “fuzilamento sumário, sem julgamento, de
milhares de guinéus.
E em 1977, na sua obra “Livro
Negro da Descolonização“,
Luiz Aguiar volta ao mesmo assunto recordando os
milhares de mortos referidos no livro de Spínola,
acrescentando nomes de oficiais e sargentos dos
“comandos” africanos fuzilados na Guiné.
E para quem tiver dúvidas sobre o sucedido, neste
trabalho podem verificar que, em dois casos, as
certidões de óbito de um oficial e de um sargento, aqui
reproduzidas, dizem expressamente que “morreram
de fuzilamento”.
E fico-me por
aqui. Ouviram as palavras do Presidente da Associação de
Combatentes da Guiné, Sargento José Monteiro. Esta
situação vivida pelos guineenses que combateram ao lado
dos portugueses contra o PAIGC é tão confrangedora e
mesmo vergonhosa, que merece a nossa veemente
condenação. Tal como os restantes exilados em Portugal,
os antigos combatentes devem ser devidamente apoiados
pelo Estado, como expressamente referia o texto do
Acordo de Argel e depois vertido para a legislação
portuguesa.
A este propósito recordo que as várias entidades e
pessoas de todos os quadrantes políticos, que se
encontravam no programa “Prós e Contras” de Fátima
Campos, de 15 de Outubro passado, foram unânimes em
confirmar o escândalo desta situação.
Depois da denúncia feita neste programa de TV, com
tanta audiência, será que tal vai ser tomado em
consideração pelo Governo Português? Esperemos que sim.
Muito obrigado pela vossa atenção.
Manuel
Amaro Bernardo
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(Nota)
- anotação, de um colaborador do portal UTW:
Refere-se a Manuel Augusto Seixas Quinhones de
Magalhães, (em Fev75 tenente de artilharia colocado no
RAL1-Sacavém): filho do coronel de infantaria Emiliano
Quinhones de Magalhães (07Ago1922-29Mai1996), que – em
Fev-Abr59 capitão de infantaria CEM –, havia estagiado
em Arzew (Argélia) no "Centre d'Instruction de
Pacification et Contre-Guerrilla"; posteriormente em
Luanda exerceu no QG/RMA a chefia da 3ªRep/Operações,
até ser em 17Mar61 nomeado pelo CEMGFA como responsável
pela Defesa Civil de Angola (futura OPVDCA), coordenando
missões entre comandos militares e administradores
civis; em 08Jun72-15Set74 tenente-coronel, concluiu a
sua missão ultramarina, em Moçambique como comandante do
BCac3886 na ZOT-RMM)