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Enfermeiras Pára-Quedistas Portuguesas
Elementos cedidos por um colaborador
do portal UTW

Enfermeiras Pára-Quedistas
Portuguesas
Dia 23 de Fevereiro de
2017, pelas 18H00, na Sala do Algarve da Sociedade de
Geografia
(Rua das Portas de Santo
Antão, n.º 100, 1150-269 Lisboa),
Isabel
Bandeira de Mello (Isabel Rilvas)
A impulsionadora da
criação das Enfermeiras pára-quedistas
A primeira mulher
pára-quedista da Península Ibérica
Entrevista
Com a devida vénia, os
elementos que se seguem foram
Informação do veterano
Inocêncio Santos
RECORDANDO - Depois
dos desafios
Com o título em epígrafe
apresentou o “Suplemento de Domingo” do Diário de
Notícias de 30 de Outubro findo, e pelo punho de Luísa
Manoel Vilhena, uma entrevista com Isabel Manuela
Bandeira de Mello Rilvas – a “nossa” Isabelinha,
tão querida de todos nós e cuja convivência, ao longo
das décadas dos anos 50 e 60, tanto procurávamos e
apreciávamos.
Pela oportunidade do tema desenvolvido, aos mais novos (que,
porventura, nos lerem) apontamos o exemplo ímpar de
Dona Isabel Rilvas, que se define, aliás, por um
inquebrantável “querer” – único meio que pode tornar
realidade o objectivo a alcançar: o domínio do Espaço.
Actualmente (à data da entevista) embaixatriz de
Portugal em Washington, Isabel Rilvas é, contudo, mais
conhecida como diplomata sobretudo pela forma como tem
procurado apoiar desde sempre a acção de seu marido,
Leonardo Mathias.
Com 23 anos de carreira, distribuídos anos pelos seis
postos que o seu marido ocupou (Cidade do Cabo, Madrid,
Genebra, Roma, Bagdade e Nova Iorque), Isabel adquiriu
uma longa experiência quanto aos problemas que têm de
enfrentar as mulheres dos diplomatas – o que a levou a
criar a “Associação das Mulheres dos Diplomatas
Portugueses“. Mas é sobretudo acerca das suas
experiências no ar que esta conversa incidiu…
Luísa Vilhena – Sabemos que a Isabel foi,
desde muito cedo, atraída pela fascinação da aeronáutica
e tem sido uma das raras mulheres portuguesas para quem
voar é uma atracção apaixonante. Porque terá surgido em
si esse desejo pouco vulgar e tão determinado, tendo a
Isabel sido educada num meio tradicional?
Isabel Rilvas – Eu quis desde sempre fazer
qualquer coisa diferente.
Luísa –
Mas porquê voar?
Isabel – Penso que esse meu desejo tinha duas
origens: uma física, outra espiritual. Eu era frágil,
estava sempre doente, toda a família tomava muitas
cautelas comigo…Chamavam-me o aranhiço. Por causa de uma
operação que fiz a um pé, estive vários meses numa
cadeira de rodas. Creio que esta fragilidade, que
durante tantos anos me limitou, foi desenvolvendo em mim
um grande desejo de evasão, de libertação. E para mim
tudo isso se concretizava em voar. Esta é a origem
física. Por outro lado, havia nesse tempo um forte
movimento de acção católica que eu vivi com grande
entusiasmo, uma grande alegria, muito, muito ideal. Não
sei se fará sentido dizer que tudo isso me puxava «para
cima», o que ia ao encontro do meu desejo de voar.
Luísa – Quis então ser piloto por espírito de
misticismo e por desejo de superação?
Isabel –
Talvez. Não sei. Digamos antes que eu
queria voar em sentido real e espiritual. Um pouco como
lemos no livro “Fernão Capelo Gaivota” – lembra-se?
“Porquê, Fernão, porquê? – perguntava lhe a mãe. –
Porque é que te custa tanto ser como o resto do bando?
Porque não deixas os voos altos para o pelicano e para o
albatroz? Porque não comes? Filho, tu estás penas e
osso!” Comigo também falavam assim. E eu era também pele
e osso, com 1,60 m e 46 quilos, e também queria voar
alto, como o Fernão Capelo Gaivota.
Luísa –
Quando começou então a voar?
Isabel –
Comecei a minha instrução, como
piloto-aviador numa sexta-feira, 13 de Agosto de 1953,
na Escola de Aviação Civil do Aero Club de Portugal, em
Sintra.
Luísa – É uma data curiosa, que poucos
escolheriam. Não tem superstições?
Isabel –
Não tenho. E muito menos com o dia
13, que foi a data escolhida por Nossa Senhora para
aparecer em Fátima.
Luísa – Que idade tinha nessa altura?
Isabel – Tinha 18 anos.
Luísa –
Os seus pais não se opuseram?
Isabel –
Não. Eu fui-lhes sempre dizendo o que
ia fazer: que ia à inspecção médica, que me ia inscrever
como sócia no Aero Club de Portugal, que estava a tratar
dos papéis necessários… Quando eu chegava sentiu com os
resultados, mostravam-se um pouco admirados e diziam:
«Então conseguiste? Muito bem». Talvez achassem que eu
acabaria por desistir ou que não me aceitassem. Ou não
queriam dar-me o desgosto de contrariarem o meu sonho. A
certa altura preveni-os de que no dia seguinte começava
a minha instrução. E o meu pai respondeu, sem
comentários, que não queria que eu fosse sozinha, mas
que ele me acompanhava para verificar como era, em que
condições ia voar. Fui com o meu pai nesse dia e todos
pensaram que seria ele quem ia tirar o «brevet». Eu era
franzina, com meias uma curtas e rabo de cavalo, o que
me fazia parecer ainda mais nova. Depois disseram-me que
quando me viram entrar para o avião pensavam, «Que anda
a fazer a miúda?» Voava sempre acompanhada por uma
senhora, porque os meus pais achavam que eu não devia
chegar sozinha a campos de aviação onde em geral só
estavam homens. Eram outros tempos.
Luísa –
Quanto tempo levou a tirar o «brevet»?
Isabel –
Bastante. As lições foram
interrompidas no Inverno. Entretanto, surgiu nova
legislação que obrigava os pilotos civis a um importante
exame teórico, que me fez estudar muito. E não queriam
que eu fosse largada com poucas horas de treino. Nunca
fui aquele tipo de pessoa de chegar, ver e vencer. Eu
consigo chegar onde quero por perseverança, por força de
vontade. Exijo de mim própria uma grande disciplina. No
campo da aeronáutica, sempre me treinei com muita
regularidade, a repetir, a repetir até acertar.
Luísa – Como foi a sensação de voar sozinha?
Isabel – Uma sensação de libertação. Tinha
finalmente conseguido o meu sonho. Mas estranhei, é
claro, a falta do instrutor, tanto mais que o avião em
que tirei o «brevet» era um biplano aberto, onde o
instrutor vai no lugar da frente. Há, portanto, uma
distribuição de peso que fica completamente alterada
quando se voa sozinha. Tive a impressão desagradável de
que o avião ia com o nariz no ar, o que me abrigou logo
a compensar. Foi o meu primeiro contacto com
experiências novas que teria de resolver por minha
conta.
Luísa – Quando teve de levantar voo sozinha, e
sobretudo de aterrar sozinha, não sentiu medo?
Isabel – Acho que senti algum. Mas a alegria
foi muito maior que o medo. E dali em diante cada voo
era um novo desafio que eu fazia a mim mesma e à minha
capacidade de me ir aperfeiçoando, de me ir
identificando com o avião.
Luísa – Havia já nesse tempo, em Portugal,
outras mulheres que tivessem «brevet»?
Isabel –
Houve várias, mas na minha época pelo
menos duas: uma senhora de Angola, Alzira do Nascimento
e Maria Amélia de Lemos, irmã da escritora Ester de
Lemos, por quem tenho a maior admiração.
Luísa –
Em que data tirou o seu «brevet» Isabel –
Em 24 de Agosto de 1954. Tenho uma
boa recordação desse dia.
Luísa – E que utilização deu a Isabel ao seu
«brevet»?
Isabel – No principio limitava-me a voar, a
treinar. Depois comecei a entrar em provas e a
participar em festivais. Em 24 de Setembro de 1955
entrei no Festival Aeronáutico da Figueira da Foz,
classificando-me em 3º lugar na prova de acrobacia que
aérea.
Luísa – Já fazia então acrobacia?
Isabel – Em 7 de Junho de 1956 tomei parte na
primeira Volta Aérea a Portugal, desclassificando-me por
avaria mecânica, que que obrigou à substituição da
hélice. Em 25 de Setembro de 1957 entrei novamente no
Festival Aeronáutico da Figueira da Foz, onde obtive o
segundo lugar na prova de lançamento da mensagem e uma
taça por participação numa prova livre de acrobacia
aérea. Em 15 de Novembro de 1958, no Festival Aéreo do
Outono, em Sintra, ganhei o primeiro lugar na
classificação geral e o primeiro na aterragem de
precisão.
Luísa – Havia outras participantes femininas
nessas provas?
Isabel – Não. No primeiro campeonato nacional
de acrobacia aérea, em Sintra, a 26 de Junho de 1958,
era eu a única mulher. Obtive o segundo lugar. A minha
experiência, nesse tempo, reduzia-se a 260 horas de voo.
Luísa – Entrou noutras provas?
Isabel – No festival do fim de ano, em 1960,
obtive o primeiro prémio em avaliação de distâncias e
também o primeiro no lançamento de mensagens.
Luísa – Que tipos de aviões pilotou?
Isabel – Os aviões daquele tempo: «Tiger»,
«Club» «Piper», «Navion» de 185 cavalos, «Super-Cruiser»,
«Colt», etc.
Luísa – Mantém ainda hoje a sua licença?
Isabel – Não. Tive-a sempre válida entre 1954
e 1977 – data em que a perdi por motivos que nada têm a
ver com aviação. Mas além da licença portuguesa, obtive
várias outras. Tive licença espanhola entre 1964 e 1966,
entre Janeiro de 1975 e Agosto de 1976 tive licença
italiana. Em 1981 obtive licença americana, em New
Jersey. E já em Março de 1962 tinha obtido licença
sul-africana. Mas, qualquer licença, para se manter
válida, tem que ser alimentada com um certo número de
horas de voo realizadas nos próprios países, o que só me
era possível fazer enquanto lá vivia.
Luísa –
Continuou portanto a voar, não
obstante o seu casamento, o nascimento dos seus filhos,
a carreira diplomática do seu marido?
Isabel –
O meu marido não objectou às minhas
actividades aeronáuticas. Compreendeu o meu entusiasmo.
Deu-me apoio. Foi até mais longe, porque ele próprio
tirou também o «brevet» de piloto quando estávamos
noivos e o de pára-quedista dez anos mais tarde.
Luísa – E utilizou estes «brevets»?
Isabel – Muito pouco. Acho que foi apenas uma
forma de me demonstrar que também era capaz.
Luísa – Ou um gesto de amor?
Isabel –
O Leonardo não é romântico. É
pragmático.
Luísa – Qual foi, dentre as actividades
aeronáuticas que praticou, a que permitiu alcançar mais
plenitude?
Isabel – A acrobacia aérea. O domínio da
máquina, obtendo dela a melhor «performance», deu-me uma
sensação de perfeita unidade piloto-avião com um sabor
apaixonante que nunca consegui igualar. Talvez eu
tivesse uma aptidão especial para a acrobacia. Ou seria
por eu pesar tão pouco? Os meus pés não chegavam aos
pedais do avião, tinham que me por almofadas… Ou talvez,
até, por ter tão pouca força física: pilotado por mim o
avião tinha reacções quase autónomas, realizando assim
melhor o projecto do seu construtor e as manobras para
que tinha sido concebi do. Não sei. A verdade é que ele
aceitava as figuras acrobáticas, apenas corrigidas aqui
ou ali. Pedia tudo ao avião e dava-lhe até ao limite das
minhas forças, o que me provocava às vezes até fortes
dores físicas quando, excepcionalmente, a atitude do
avião se tornava incorrecta.
Luísa –
Acrobacia experimental é um desporto
arriscado… Não eram muito imprudentes essas suas
experiências sem professor?
Isabel –
Não acho que acrobacia seja mais
perigosa do que muitas outras coisas menos
interessantes. Eu lia livros, fazia perguntas a pilotos
militares consagrados, estudava mecânica, tinha contacto
directo com os motores dos aviões.
Luísa – Além de ser piloto, fez também voo sem motor
e foi pára-quedista, não é verdade?
Isabel –
Exactamente. Em outubro de 1955 obtive o
«brevet» de voo à vela, com o nº 81, em Alverca. Fui a
segunda mulher portuguesa a obter esse «brevet».
Luísa – Também se dedicou muito ao voo à vela?
Isabel – Não. A 2 de Junho de 1960, em
Alverca, bati o recorde nacional de permanência no ar,
com 11 horas e 15 minutos. Andava lá por cima, numa
ascendente sobre a Base, e estava-me a sentir bem. Eram
mais que horas de almoço. O Sr. Manuel gritava lá para
cima que descesse, porque já era muito tarde. Depois, o
instrutor escreveu no registo de voo: «A Isabel fez 11
horas e 15 minutos»
Luísa – Deixou então o voo à vela e regressou
ao voo com motor. Voltou a ocupar-se com acrobacia,
competições e festivais?
Isabel – Eu tinha entrado numa fase em que
desejava dar uma feição útil e social ao meu amor pela
aeronáutica. Com os conhecimentos que tinha, foi-me
possível fazer um estudo quanto à possibilidade de uma
certa cobertura da área de Trás-os-Montes, que era nesse
tempo uma região ainda muito isolada, com aldeias
dificilmente acessíveis, onde havia grande mortalidade
infantil. Pretendia eu, com o auxílio de assistentes
sociais transportadas por mim a regiões mais
abandonadas, fazer campanhas de vacinação, educação de
futuras mães, alimentação adequada dos filhos, higiene e
auxilio à terceira idade. Apresentado o projecto, na
Aeronáutica Civil, para autorização de aterragens em
campos particulares e areais dos leitos dos rios, este
foi-me negado.
Luísa – Perante essa desilusão, desistiu da
ideia de dar uma utilidade social ao seu «brevet»?
Isabel – Passado pouco tempo, acompanhei o meu
pai a França, onde entrei em contacto com as IPSA –
Enfermeiras pára-quedistas e Socorristas do Ar da Cruz
Vermelha Francesa. Era uma organização complexa,
compreendendo mulheres pilotos de aviões civis, pilotos
de helicóptero, enfermeiras e médicas pára-quedistas. O
pára-quedismo militar em Portugal apenas começava e o
pára-quedismo civil só daí a dez anos viria a ser uma
realidade. Conclui por onde poderia conseguir os meus
fins.
Luísa – Mas, Isabel foi pára-quedista civil.
Isabel – Comecei a pensar nisso justamente no
decorrer da minha visita às IPSA, em França. Mas se eu
quisesse ser pára-quedista, teria de mudar completamente
a minha formação aeronáutica. A diferença entre um
piloto e uma pára-quedista é que, para um piloto o
abandono do avião, a não ser em caso extremo, é um acto
de covardia. Ao passo que a função da pára-quedista se
baseia no abandono do avião.
Luísa –
Preferiu então continuar a voar?
Isabel –
Continuei a voar, mas tinha caído
quase na rotina. E eu não gosto de rotina. Seis meses
depois parti para França, onde, com o apoio moral da
Cruz Vermelha Francesa, tirei o meu «brevet» de
pára-quedismo.
Luísa – Em que ano foi isso?
Isabel – Em 1956. Em Portugal não tinha ainda
sido iniciado o pára-quedismo civil feminino. A minha
visita às IPSA tinha-me trazido à ideia a possibilidade
de termos, também em Portugal, enfermeiras e médicas
para-quedistas.
Luísa – Lembro-me que, por essa altura, esteve
na África portuguesa e que Kaúlza de Arriaga estava
pensando com grande interesse na possibilidade de
treinar enfermeiras pára-quedistas.
Isabel –
Fui a Angola em 1959, convidada pelo
Aeroclube de Luanda. Participei no Festival que concluiu
o Rallye Aéreo ” Major Baltasar”, efectuando um salto
comandado a 3 de Maio daquele ano. Foi o primeiro salto
realizado em Angola por um pára-quedista civil. De
Angola segui para Moçambique, a convite do Aero Club de
Lourenço Marques, e lá efectuei também um salto
comandado, em 17 de Maio de 1959, no Aeroporto de
Mavalane. Fui o primeiro pára-quedista português, civil
ou militar, que saltou em Moçambique.
Luísa –
E quando se criaram as enfermeiras
pára-quedistas?
Isabel – Foi constituído um corpo de
enfermeiras pára-quedistas, em 1961, que se manteve
actuante ao longo dos 13 anos de guerra. As autoridades
aeronáuticas criticavam-me, com uma dureza que nunca
entendi, por eu falar tanto em enfermeiras
pára-quedistas, não sendo eu própia enfermeira. «Pois,
pois, só pensa em voar, mas agora você precisa é de
fazer uma coisa séria» – disse-me uma alta
individualidade da então Direcção-Geral da Aeronáutica
Civil. «Uma coisa séria» significava para eles um curso
de enfermagem. Ora eu não desejava tirar um curso de
enfermagem. Tinha estado demasiado tempo doente e até
imobilizada, pelo que a doença me afligia. Decidi-me no
entanto a tirar o curso. O meu principal objectivo,
naquela fase, era fazer propaganda do pára-quedismo para
interessar outras raparigas no intuito de poder ser
formado o tal corpo de enfermeiras pára-quedistas. Creio
que a minha passagem pelo curso de enfermagem terá
contribuído para fazer aceitar o pára-quedismo pelas
futuras enfermeiras como uma coisa natural. E quando
estive em Angola e Moçambique, fiz algumas conferências
nesse sentido.
Luísa – Continuava, entretanto, a não haver
possibilidade, em Portugal, de tirar um «brevet» de
pára-quedismo civil?
Isabel – Continuava. Eu mantinha a minha
licença francesa, saltando em Portugal, no Batalhão de
Caçadores Pára-quedistas, em Tancos. Pela minha parte,
acho que os militares se tinham já habituado à minha
presença. Entre as pessoas que praticam juntas uma
actividade deste género criam-se laços e recordações que
ficam para sempre. Tínhamos vivido juntos algumas
situações difíceis e rido juntos quando aconteciam
peripécias divertidas. Uma vez fui cair numa horta, de
onde o proprietário me correu à vassourada e me acusou
de grande mentirosa por pretender convencê-lo que tinha
vindo do ar, trazida pela força do vento. Éramos todos
amigos, de uma de amizade cimentada em experiências
comuns.
Luísa – Quando casou interrompeu por algum tempo
a sua actividade aeronáutica?
Isabel – Sim, mas nunca a abandonei. Conheci
em 1960 o homem extraordinário com quem casei. Diplomata
de carreira, como sabe, partimos para o nosso posto na
cidade do Cabo, na África do Sul, onde como já disse,
tirei também licença de piloto.
Luísa –
Já como embaixatriz junto das Nações
Unidas, em Nova Iorque, ainda tirou o «brevet» de balão
de ar quente, não é verdade?
Isabel –
Exactamente. E foi uma experiência
extraordinária. Um balão de ar quente é uma coisa
enorme, cabem lá dentro 70.000 pés cúbicos de ar; não
sei se isto diz alguma coisa. Parece uma garagem quando
está no chão a ser enchido. Foi uma experiência
extraordinária, mas dura, porque tive de tirar aquele
«brevet» durante o Inverno, que nos Estados Unidos é
muito rigoroso. As temperaturas eram sempre negativas e
eu não tinha equipamento adequado, porque era muito caro
e o custo do «brevet» muito elevado também. Tive que
optar.
Luísa – Chegou a completar o seu «brevet» de
balão?
Isabel – Sim. Tenho o «brevet» nº 2 311 569,
de 10 de Março de 1981. Perfiz doze horas de voo em
balão, sendo assim a primeira portuguesa a obter esta
licença.
Luísa – Ao longo da sua vida diplomática, que
reacção tem sentido quanto a essa sua faceta invulgar de
mulher voadora?
Isabel – Acho que nenhuma. Poucas pessoas
conhecem essa minha faceta. E de qualquer forma, no
estrangeiro, qualquer «hobby» é bem aceite.
Luísa – E os seus filhos, como têm reagido?
Isabel – Bem. Foram habituados nisso desde
sempre. Quando eram pequenos, estavam dentro do avião
num dia em que o Leonardo e eu saltávamos. Viram o pai e
a mãe saltar para fora do avião e creio que se
divertiram com isso.
Luísa – Nenhum dos seus filhos segue as suas
pegadas aeronáuticas?
Isabel – O meu filho do meio fez alguns saltos
da torre só pela curiosidade.
Luísa –
Sentiu que a vida diplomática do seu
marido a afastou do seu grande amor pelo ar – ou gosta
de ser diplomata?
Isabel – No principio custou-me muito
separar-me do meu pais, dos meus pais, dos meus amigos e
dos meus aviões. Depois percebi que a vida diplomática
abre horizontes maiores e me proporcionava uma riqueza
de perspectivas que não teria conhecido se ficasse
fechada em Portugal. Passei a gostar da vida
diplomática.
Luísa – Considera terminadas as suas
experiências no ar?
Isabel – Tenho sempre projectos. Nunca deixo
nada definitivamente para trás. Há certas actividades
que têm o seu prazo na vida – mas outras vão surgindo,
na mesma linha.

Reencontro após largos
anos de duas grandes Senhoras da Aviação Portuguesa.
Anneliese Mosch e Isabel Rilvas. 11 Dezembro 2016
José Rocha. 20 de
Dezembro de 2016. Entrevista e imagens publicadas
originalmente na Revista do Ar, propriedade do Aero Club
de Portugal. Um agradecimento a Duarte Fernandes Pinto
pela colaboração e foto actual de Anneliese Mosch e
Isabel Rilvas.
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