Maurício Leonel de Sousa Saraiva,
Coronel de Infantaria ‘Comando’
na situação de reforma extraordinária.
Nasceu
no ano de 1939, na (então) Vila de
Mariano Machado, à época sede do
concelho da Ganda do distrito de
Benguela, na Província Ultramarina de
Angola.
Em 31 de Agosto de 1960 incorporado na
Escola Prática de Infantaria (EPI
-Mafra) «AD UNUM» como Soldado-Cadete nº
2065/60, para frequentar o curso de
oficiais milicianos (COM);
Em
29 de Janeiro de 1961 promovido a
Aspirante-a-Oficial Miliciano (n/m
61049359) Atirador de Infantaria e
colocado no Regimento de Infantaria 2
(RI2 – Abrantes) «EXCELENTE E VALOROSO»;
Em
10 de Abril de 1961, tendo sido
mobilizado para servir Portugal na
Província Ultramarina da Guiné, embarca
em Lisboa com destino a Bissau;
Em 19 de Abril de 1961 deslocado para
Bedanda, a fim de comandar o
destacamento local da 4.ª Companhia de
Caçadores
Indígena do Comando Territorial
Independente da Guiné (4ªCCacI/CTIG)
«AUT VINCERE AUT MORI»;
Meses depois transferido para a capital
provincial, onde passa a comandar o
Pelotão de Comando e Serviços da
Companhia de Comando e Serviços do
Quartel General do Comando Territorial
Independente da Guiné (CCS/QG-CTIG) «A
LEI DA VIDA ETERNA
DILATANDO»;
Em 29 de Outubro de 1963, com outros
oficiais e sargentos metropolitanos, e
praças guineenses do Comando Territorial
Independente da Guiné (CTIG), inicia no
noroeste de Angola um curso acelerado de
'comandos' no Centro de Instrução 16
(CI16-Quibala) «AUDACES FORTUNA JUVAT»;
Em 6 de Dezembro de 1963 regressa a
Bissau:
- «Quando
chegámos à Guiné, no princípio de 1964
estava para se realizar uma operação
"muito secreta"; mas ao ir a uma
cervejaria
[em Bissau], o empregado
perguntava quando é que íamos para a
Ilha do Como. Depois de ter estado em
Angola a ver como estavam a ser
preparados os comandos, estive na Guiné
a formá-los destacado juntamente com
outros oficiais e sargentos. Mas em
lugar de irmos formar comandos, fomos
para a operação chamada 'Tridente'
[Memórias
de um veterano] - [Antes
e depois]
na
Ilha do Como: intervieram fuzileiros,
pára-quedistas, companhia de caçadores,
batalhão de cavalaria nº490, Força Aérea
com aviões e helicópteros, Marinha. E os
instrutores dos futuros comandos, que
éramos nós mais uns soldados e sargentos
que nos entregaram, porque eram os mais
aguerridos das suas unidades, tais como:
furriel
[miliciano
António Manuel Constantino
Vassalo]
Miranda,
primeiro-cabo Cruz, primeiro-cabo
Marcelino da Mata, primeiro-cabo
[Abdulai Queta]
Jamanca, soldado
Soldas
[António João
Paulista Solda],
e tantos outros
a quem demos uma lambuzadela de
instrução antes da Operação Tridente
[Memórias
de um veterano] - [Antes
e depois].
Dos 25 'comandos' citados, alguns deles
- três oficiais, sete sargentos e mais
quinze homens cheios de boa vontade e
que queriam ser comandos -, foram
transportados
[de Bissau com o
BCav490]
para a ilha na fragata Nuno Tristão
[às 10:00 de 14Jan1964].
[...]
Aquilo
parecia um desembarque em toda a regra:
o objectivo da operação era limpar a
ilha de inimigo, que tinha aí um
autêntico celeiro, com muito gado e
arroz, e estava muito bem organizado. Eu
estava com certo receio daquilo:
desembarcar de noite na praia os
'comandos' numa LDP [lancha de
desembarque pequena], para constituirmos
a cabeça de praia e escolher o sítio da
mesma onde seria estabelecida uma base
logística e de comando; as outras forças
intervenientes desembarcaram noutros
pontos e os Comandos desembarcaram sem
grandes problemas. Fizemos os nossos
'buracos' e instalámo-nos, mas eu não
sabia que na Guiné as marés têm uma
amplitude muito grande - chegam a 3/4
metros -, e ao fim de uma horas os
'buracos' estavam todos cheios de água e
tivemos de ir fazer outros mais adiante;
levei uma repreensão do brigadeiro Louro
de Sousa, devido ao local que tinha
escolhido para base logística e de
comando - nunca percebi bem porquê, ao
fim e ao cabo tudo ficou no sítio
escolhido. Quando começámos a
infiltrar-nos na mata central (havia
outra no norte da ilha e nós tínhamos
desembarcado no sul), aquilo tornou-se
muito duro. Fizemos uma série de
operações e entrámos na mata: fizemos
golpe-de-mão a acampamentos inimigos e
emboscadas; capturámos algum material e
provocámos baixas ao inimigo; fizemos
algumas operações conjuntas com o
destacamento de fuzileiros
[DFE8]
do comandante
[primeiro-tenente fze Guilherme Almor]
Alpoim
Calvão e com os pára-quedistas
[PelPQ111 comandados pelo alferes de
artilharia António Manuel Bairrão Pombo
dos Santos].
[...]
Numa
ocasião, os fuzileiros estavam cercados
e nós recebemos ordem para largarmos o
que estávamos a fazer e ir lá dar-lhes
uma ajuda e, entre ambos, conseguimos
sair de lá: aquilo era uma depressão de
terreno, o inimigo estava nas árvores e
havia rajadas por todos os lados; nós
metemo-nos lá dentro com eles, os
fuzileiros eram uma tropa bem preparada
e 'sui generis', todos com uma barba
muito grande. Às tantas disparei uma
engenhoca, inventada por um aventureiro
italiano chamado Dante Vacchi que tinha
estado em Angola: um tubo com um
SNAB-37mm, projéctil da Força Aérea
autopropulsionado, que quando acertava
era por acaso pois nem sequer tinha
aparelho de pontaria; acertei na copa da
árvore e caiu um tipo que eu nem sequer
tinha detectado. Aliás, deles tínhamos
apenas a percepção de onde saíam as
rajadas.
[...]
A
determinada altura juntaram-se os
fuzileiros, os pára-quedistas e os
comandos: havia sempre o bom costume de
contar os militares que levávamos, para
ver se tinham voltado todos, até porque
tínhamos feito uma operação tremenda e
com problemas muito sérios, em que
enfrentámos um inimigo muito valente, na
mata grande no centro da ilha; os
pára-quedistas tinham tido situações
muito difíceis e com algumas baixas.
Reunimo-nos na orla da mata pequena, em
frente a um terreno aberto com cerca de
quinhentos metros desde a orla da mata
grande; tínhamos passado da mata grande
à pequena e da pequena íamos para o
canal que separava a ilha de terra
firme, por onde vinham as lanchas para
nos levar a uma fragata. Na contagem,
numa das unidades faltavam dois
soldados: houve cenas muito duras com
toda a gente muito tensa e eu resolvi
voltar à mata grande, para ir buscar os
soldados que faltavam; não sabia se
estavam mortos ou feridos e levei comigo
dois soldados, um meu e outro fuzileiro.
Quando estávamos a cruzar a clareira,
foi infernal com rajadas por todo o
lado: no meio do descampado havia morros
de formiga branca, chamada baga-baga na
Guiné, que chegam a ter dois metros de
altura e são duríssimos; abrigámo-nos aí
e lá conseguimos chegar à orla da mata
grande. O primeiro soldado que vimos
estava morto: trouxemo-lo desde a mata
até aos morros de baga-baga e fomos
outra vez ao outro lado; encontrámos o
ferido, era um homem enorme, um militar
chamado Palha, estava ferido na coluna e
ficou paraplégico; transportámo-lo até
aos morros - um morto transporta-se de
qualquer maneira, mas um ferido é muito
difícil. Mas conseguimos fazê-los chegar
à outra mata pequena.
[...]
A
Operação Tridente
[Memórias
de um veterano] - [Antes
e depois]
foi dura, não
conseguimos surpreender o inimigo que
estava muito bem preparado; a operação
era para durar poucos dias, mas durou
algumas semanas
[até 24Mar1964]
e as nossas tropas tiveram alguns
feridos e mortos.»
¹
Em
4 de Maio de 1964 louvado pelo cessante
Comandante-Chefe das Forças Armadas da
Guiné (CCFAG) brigadeiro Fernando Louro
de Sousa, porque...
-
«Tendo tomado parte em todas as
numerosas acções em que estes
[comandos]
intervieram na Operação Tridente
[Memórias
de um veterano] - [Antes
e depois], nas
condições mais diversas, sempre
demonstrou entusiasmo, agressividade,
iniciativa, coragem e audácia
invulgares. Foram vários os rasgos de
bravura praticados pessoalmente por este
oficial e pelas tropas sob o seu
comando, que destemidamente actuaram em
campo aberto e se internaram nas matas à
procura do inimigo, que se apresentava
forte e bem armado, sabendo sempre
reagir às emboscadas e procurando
aniquilar o adversário».
Em 2 de Junho de 1964
agraciado pelo Ministro do Exército com
a
Medalha de Prata
de Valor Militar com palma.
Alferes
Miliciano de Infantaria
MAURÍCIO LEONEL DE SOUSA SARAIVA
CCS/QG/CTIG
GUINÉ
Transcrição do louvor publicado na Ordem
do Exército n.º 13 – 2.ª série, de 1964:
Por Portaria de 2 de Junho de 1964:
Manda o Governo da República Portuguesa,
pelo Ministro do Exército, adoptar, para
todos os efeitos legais, o seguinte
louvor, conferido em Ordem de Serviço do
Comando-Chefe das Forças Armadas da
Guiné Portuguesa, n.º 7/64 de 4 de Maio
do corrente ano, ao Alferes Miliciano de
Infantaria, Maurício Leonel de Sousa
Saraiva, da Companhia de Comando e
Serviços, do Quartel-General do Comando
Territorial Independente da Guiné e
prestando serviço como comandante do
grupo de comandos, porque, tendo tomado
parte em todas as numerosas acções em
que estes intervieram na operação
"Tridente"
[Memórias
de um veterano] - [Antes
e depois], nas condições mais diversas,
sempre demonstrou entusiasmo,
agressividade, iniciativa, coragem e
audácia invulgares.
Foram vários os rasgos de bravura
praticados pessoalmente por este oficial
e pelas tropas sob o seu comando, que
destemidamente actuaram em campo aberto
e se internaram nas matas à procura do
inimigo, que se apresentava forte e bem
armado, sabendo sempre reagir às
emboscadas e procurando aniquilar o
adversário.
De salientar a sua acção pessoal e das
suas forças em 1 de Março de 1964,
quando, embrenhando-se numa cerrada mata
a nordeste de Curco, conseguiram, apesar
do cansaço e esforço despendido,
detectar e destruir um dissimulado,
vasto e bem apetrechado acampamento
inimigo. Também digna de realce a sua
actuação, em 7 de Fevereiro de 1964,
quando com as suas forças se deslocou em
campo aberto e numa extensão de mais de
300 m, debaixo de intenso fogo inimigo,
para retirar o corpo de um soldado
atingido mortalmente pelo adversário.
A forma como conduziu a sua unidade,
impulsionando e orientando os seus
homens, servindo-lhes constantemente de
exemplo e criando-lhes espírito de corpo
digno de relevo, muito contribuiu para o
bom êxito das operações e as suas
qualidades de intrepidez, abnegação e
valor, impõem-no como verdadeiro Chefe
guerreiro, que o tornam digno de
respeito e admiração de subordinados e
superiores e merecedor da consideração
das Forças Armadas e do reconhecimento
da Nação.
Ministério do Exército, 2 de Junho de
1964. O Ministro do Exército, Luz Cunha.
Transcrição da portaria que concede a
condecoração, publicada na mesma Ordem
do Exército:
Por Portaria de 2 de Junho de 1964:
Condecorado com a Medalha de Prata de
Valor Militar com palma, nos termos do
artigo 7.º, com referência ao § 1.º do
artigo 51.º, do Regulamento da Medalha
Militar, de 28 de Maio de 1946, o
Alferes Miliciano de Infantaria,
Maurício Leonel de Sousa Saraiva, da
Companhia de Comando e Serviços, do
Quartel-General do Comando Territorial
Independente da Guiné, porque, tomando
parte em numerosas acções nas condições
mais diversas, demonstrou entusiasmo,
agressividade, iniciativa, coragem e
audácia invulgares contra um inimgo que
se apresentava forte e bem armado.
É de salientar a sua acção e a das suas
forças que, embrenhando-se numa cerrada
mata, conseguiram, apesar do cansaço e
esforço dispendido, detectar e destruir
um simulado, vasto e bem apetrechado
acampamento inimigo. Também é de
destacar a sua actuação quando, com as
suas forças, se deslocou em campo aberto
e numa extensão de mais de 300 m,
debaixo de intenso fogo inimigo, para
retirar o corpo de um soldado atingido
mortalmente pelo adversário.
No dia
10 de Junho de
1964, foi condecorado com a
Medalha de Prata de Valor Militar com
palma, perante as Forças Armadas
Portuguesas reunidas em parada no
Terreiro de Paço (Lisboa), por
relevantes feitos em combate no
teatro-de-operações da Guiné.
Veio a ser também agraciado com o
Prémio Governador
da Guiné,
por feitos em combate na Operação
Tridente
[Memórias
de um veterano] - [Antes
e depois].
- «Depois
desta operação começou a formação e
constituímos três grupos: os 'Fantasmas'
era o meu; os 'Camaleões'
era o do alferes
[miliciano Justino Coelho]
Godinho; e os 'Panteras'
era o do alferes
[miliciano de artilharia]
Pombo
[dos
Santos].»
¹
Em 23
de Julho de 1964 colocado em Brá para
iniciar a formação da Escola de Quadros
do Centro de Instrução de Comandos
(CICmds); e a partir de 3 de Setembro de
1964 os instruendos do 1º Curso de
Comandos da Guiné começam a Instrução de
Aperfeiçoamento Operacional (IAO) nas
matas do Morés.
Em 1 de Dezembro de 1964 promovido a
tenente miliciano;
- «Uma vez
[28Nov1964]
perto de Madina do Boé rebentou-nos uma
mina por baixo de um Unimog, a gasolina
que matou
[sete]
e feriu praticamente as duas equipas
[do GrCmds
Fantasmas]:
o Unimog incendiou-se e as munições
explodiram, foi uma coisa tremenda e
horrível. Fiquei com o grupo bastante
dizimado
[três queimados
evacuados, e sete sepultados a 30Nov1964
em Bissau],
e resolvi logo uns dias depois, para não
deixar cair o moral, fazer uma operação
de emboscadas e golpe-de-mão com os
homens que restavam, que resultou muito
bem.»
¹
Em 22 de Maio de 1965
regressa à Metrópole e fica colocado no
Regimento de Infantaria 10 (RI10 –
Aveiro) «UBI HONOR, GLORIA» - «SENTINELA
DO VOUGA»;
Em 3 de Junho de 1965 promovido por
distinção a
capitão miliciano e agraciado com a
Medalha de
Promoção por Distinção;
Naquele mesmo dia, agraciado pelo
Ministro do Exército com a
Medalhas de Ouro de
Valor Militar com palma.
Tenente
Miliciano de Infantaria, “comando"
MAURÍCIO LEONEL DE SOUSA SARAIVA
CICmds
GUINÉ
Grau:
Ouro, com palma
Transcrição do louvor publicado na Ordem
do Exército n.º 15 – 2.ª série, de 1965
Por Portaria de 3 de Junho de 1965:
Manda o Governo da República Portuguesa,
pelo Ministro do Exército, adoptar, para
todos os efeitos legais, o seguinte
louvor, conferido em Ordem de Serviço
n.º 7, de 17 de Maio de 1965, do
Comando-Chefe das Forças Armadas da
Guiné Portuguesa, ao Tenente Miliciano
de Infantaria, Maurício Leonel de Sousa
Saraiva, do Centro de Instrução de
Comandos, pela muita prestimosa
colaboração que, na presente conjuntura,
tem dado ao Comando Territorial
Independente da Guiné e, em especial, ao
Exército, com a sua proficiente acção.
Como instrutor dos quadros dos grupos de
"comandos", comandou um grupo
constituído por instrutores e monitores,
no final do primeiro curso realizado
neste Comando Territorial Independente
da Guiné, com o qual foi efectuada uma
operação de combate, que resultou prova
excelente e irrefutável de que os seus
instruendos tinham sido cuidadosamente
preparados, mercê das inegáveis
qualidades excepcionais do instrutor.
Como
comandante do grupo de "Comandos
Fantasmas" executou 21 acções em curto
período de tempo, sempre culminadas por
retumbantes resultados, indubitavelmente
devidos à técnica perfeita empregada
pelos seus componentes, nos quais
imprimiu, pelo exemplo, o seu cunho
pessoal de combatividade e outros
atributos e virtudes militares que deram
ao grupo uma tão notável eficiência que
pode afirmar-se ser ela a razão
primordial dos constantes sucessos
alcançados e tudo isto graças às
invulgares qualidades de combatente
corajoso, valente, destemido e
munificente do seu chefe, que tão
inteligentemente o soube mentalizar e
criar no conjunto espírito de corpo.
Em Novembro de 1964 o seu grupo sofreu
perdas elevadas em combate; não
obstante, transcorridos poucos dias
levava a efeito uma nomadização com
óptimos resultados.
É de salientar que este brioso e valente
oficial se encontra no termo do
prolongamento, por oferecimento, da sua
comissão normal por imposição, não
obstante o precário estado de saúde em
que por vezes se tem apresentado ao
serviço.
Na última operação realizada, tendo o
grupo sob o seu comando sido detectado
pelo inimigo com forte poder de fogo,
assaltou valorosamente a posição e
apreendeu grande quantidade de material,
incluindo algumas das armas dos
bandoleiros, não só dos abatidos, como
também daqueles que, precipitadamente,
abandonaram a luta, perante o ímpeto do
ataque.
Pelos seus actos brilhantes e
extraordinários de firmeza, audácia,
rara decisão, coragem moral e física,
desprezo pelo perigo e desmedido arrojo
em frente do inimigo, considero
valorosos e distintos os feitos de armas
praticados pelo Tenente Miliciano Sousa
Saraiva, e que dos mesmos resultaram
lustre e glória para o Exército.
Transcrição da Portaria que concede a
condecoração, publicada na mesma Ordem
do Exército:
Por Portaria de 3 de Junho de 1965:
Condecorado com a Medalha de Ouro de
Valor Militar, com palma, nos termos da
alínea b) do artigo 6.º, com referência
ao § 1.º do artigo 51.º, do Regulamento
da Medalha Militar, de 28 de Maio de
1946, o Tenente Miliciano de Infantaria,
Maurício Leonel de Sousa Saraiva, do
Centro de Instrução de Comandos, do
Comando Territorial Independente da
Guiné.
Na
manhã de
10 de Junho de 1965, perante
tropas em parada no Terreiro do Paço,
condecorado pelo Presidente da República
com as Medalhas de Ouro e de Prata de
Valor Militar com palma;
Em 21 de Julho de 1965,
tendo sido “nomeado, por um período de
dois meses, para ministrar instrução de
Comandos no Comando Territorial
Independente da
Guiné (CTIG)”,
apresenta-se em Bissau no Quartel
General (QG) “com
guia de marcha passada
pelo Regimento de Infantaria 10 (RI10)”,
ficando integrado no corpo de
instrutores do 2º curso de comandos como
director de instrução.
No final de Setembro de 1965 regressa à
Metrópole e ao Regimento de Infantaria
10 (RI10 – Aveiro) «UBI HONOR, GLORIA» -
«SENTINELA DO VOUGA»;.
Em 29 de Março de 1967 conclui o curso
especial de infantaria.
Em 17 de Abril de 1967 convidado para
formar uma companhia de comandos.
-
«Tive a sorte de conseguir convencer o
Estado-Maior de que poderia preparar uma
unidade, seleccionar muito bem o pessoal
e dotá-lo com os materiais necessários.
Especialmente o CEME general Câmara
Pina
estava convencido de que a companhia
devia ir bem preparada, mas também bem
equipada e que isso era fundamental. Eu
era um defensor acérrimo dos pequenos
grupos bem preparados, fui aos quartéis
seleccionar os oficiais, os sargentos e
os soldados: realizaram-se exames
psicotécnicos, exames médicos, provas
físicas, e depois fomos todos para o
CIOE em Lamego. Se um homem fez centenas
de tiros durante a instrução, tem
confiança no tiro que faz quando vai
para combate e sabe utilizar a arma, o
que era uma questão fundamental nos
comandos; um soldado não pode ir
combater com cinquenta tiros feitos
durante a instrução, porque não acerta,
gasta as munições, é preciso levar mais
munições por vezes com helicópteros;
gastava-se muito mais dinheiro do que se
ele tivesse sido bem instruído.»
¹
Em 15 de Julho de 1967,
tendo sido nomeado pelo Regimento de
Artilharia Ligeira 1 (RAL1 – Sacavém)
«EM PERIGOS E GUERRAS ESFORÇADOS» para
servir Portugal na Província Ultramarina
de Moçambique, embarca em Lisboa no NTT
'Angola' com destino final a Porto
Amélia, como comandante da 9.ª Companhia
de Comandos (9ªCCmds) «FANTASMAS»:
-
«Fomos
[em 14Ago1967]
os
primeiros comandos a ir para Montepuez:
nos grupos da minha companhia havia
soldados que iam para o mato e não
levavam toda a dotação de munições,
porque sabiam que os tiros que iam fazer
eram eficazes; durante o ano a 9ª
Companhia mostrou de facto o que valia,
fazendo belíssimas operações, causando
baixas ao inimigo e capturando material.
[...]
De vez em
quando apareciam lá uns jornalistas que
iam escrever sob determinado prisma, mas
poucos deles queriam ir ao combate:
comigo, ou iam ao combate ou não - eu
nunca colaborei em preparar uma
'guerrinha' atrás do quartel.»
¹
Durante a madrugada de 9 de Abril de
1968, no decurso da Operação Dragão
Vermelho, gravemente ferido na perna
direita em consequência da deflagração
de mina antipessoal:
-
«Eu não cumpri a comissão completa
porque fui ferido. A última comissão que
fiz foi em Moçambique, onde por acção de
um artefacto explosivo fui ferido numa
perna; não a perdi imediatamente, fiz
muitíssimas operações para tentar
recuperá-la e a última foi a amputação,
porque cheguei à conclusão que era o
melhor: os enxertos partiam-se
constantemente, tinha infecções e
concluí que o melhor era amputá-la.»
¹
Evacuado para o Hospital
Militar Principal (HMP – Estrela) «INTER
ARMA FONS VITAE», onde fica internado.
Em 22 de Agosto de 1969 agraciado com a
Medalha de Prata
de Serviços Distintos com palma,
porque...
-
«Como comandante da 9ª companhia de
comandos, em operações no norte de
Moçambique, durante cerca de nove meses,
demonstrou possuir notáveis qualidades
militares, de valentia, estoicismo e
desembaraço, que estiveram na base dos
bons resultados obtidos pela sua
subunidade nos diversos golpes de mão a
bases e acampamentos do inimigo e das
populações sob o seu controle,
resultados que se traduziram pela
destruição de meios de vida, baixa em
pessoal (mortos, feridos e prisioneiros
diversos), e apreensão de várias armas e
munições.
Dinâmico, disciplinador e aprumado,
instruiu e mentalizou a companhia por
forma que a preparação psicológica,
táctica e física dos seus homens lhe
permitiu impulsionar a sua actividade
operacional com agressividade e espírito
de sacrifício, duramente postos à prova
nas flagelações e emboscadas de que a
subunidade foi alvo no decurso das
diversas operações que realizou.
Actuando em zonas de subversão violenta,
onde o inimigo, além de mais, recorria
frequentemente à implantação de engenhos
explosivos nos itinerários, alguns dos
quais a sua companhia accionou,
enfrentou sempre os riscos inerentes com
notória coragem, decisão e serena
energia, como o demonstra a sua
predilecção pelas operações nocturnas,
propiciadoras de mais elevado grau de
surpresa. Na operação 'Dragão Vermelho',
realizada em Abril de 1968, o capitão
Saraiva accionou uma armadilha que o
feriu na perna e no pé direitos, tão
gravemente que se admite que só muito
dificilmente venha a ser recuperável
para os serviços de campanha.
Oficial de elevados méritos, que se
constituiu sempre em relevante exemplo
para os seus subordinados,
notabilizou-se na Região Militar de
Moçambique por forma a honrar o
Exército, mercê dos serviços
extraordinários, relevantes e distintos
que prestou e o tornam merecedor de ser
apontado à consideração pública.»
Em 3 de Junho de 1970
agraciado o
grau de Oficial da Ordem
Militar da Torre e Espada, do Valor,
Lealdade e Mérito.
Capitão
de Infantaria
MAURÍCIO LEONEL DE SOUSA SARAIVA
Grau:
Oficial
Transcrição do Alvará publicado na
Ordem do Exército n.º 15 – 2.ª série, de
1970:
Presidência da República Chancelaria das
Ordens Portuguesas
Alvará de concessão de 3 de Junho
último:
Considerando de justiça distinguir o
Capitão de Infantaria, Maurício Leonel
de Sousa Saraiva, que, por mais de uma
vez, ganhou jus a condecorações por
acções em campanha desde 1961;
Considerando que na prática de feitos em
combate na Guiné, revelou personalidade
em cujo carácter estão vincados o valor,
a lealdade e o mérito;
Américo Deus Rodrigues Thomaz,
Presidente da República e Grão-Mestre
das Ordens Honoríficas Portuguesas, faz
saber que, nos termos do Decreto-Lei n.º
44 721, de 24 de Novembro de 1962,
confere ao Capitão de Infantaria,
Maurício Leonel de Sousa Saraiva, sob
proposta do Presidente do Conselho, o
grau de Oficial da Ordem Militar da
Torre e Espada, do Valor, Lealdade e
Mérito.
(Diário do Governo, n.º 176, II série
de 31 de Julho de 1970).
Medalha de Prata de Valor Militar, com
palma (Guiné): Ordem do Exército n.º 13
– 2.ª série, de 1964.
Medalha de Ouro de Valor Militar, com
palma (Guiné): Ordem do Exército n.º 15
– 2.ª série, de 1965.
Em 26 de Junho de 1972 considerado
oficialmente desligado do Regimento de
Artilharia Ligeira 1 (RAL1 – Sacavém)
«EM PERIGOS E GUERRAS ESFORÇADOS»;
Em 1 de Fevereiro de 1973 passa à
situação de reforma extraordinária:
-
«Resolvi
passar à reforma extraordinária porque,
por motivo de lei, não estava apto para
todo o serviço: ora eu perdi uma perna
em combate mas não me sentia deficiente
ou incapaz - um homem só fica incapaz
quando perde a cabeça; e eu não a perdi.
Pouco depois de eu ter passado à reforma
extraordinária, ocorreu o 25 de Abril.
Pedir a reforma custou-me bastante, eu
gostava daquilo, gostava das Forças
Armadas, mas como tinha feito estudos e
sempre me dediquei a fazer algo, comecei
a trabalhar em empresas civis em
Portugal e depois no estrangeiro; porque
se um civil é capaz de ser militar, um
militar também é capaz de ser civil - e
geralmente tem uma boa formação.»
¹
Comandou a 9.ª Companhia
de Comandos (9ªCCmds) «FANTASMAS»,
foi distinguido com vários louvores,
agraciado com a
Medalha de
Ferimentos em Combate,
e com as
Medalhas Comemorativas das Campanhas de
Angola, da Guiné e de Moçambique.
-
«Houve coisas que se passaram e que me
deram condecorações e promoções por
distinção, e louvores vários: tudo isto
se deve ao trabalho de um conjunto e ao
verdadeiro espírito de equipa; um
oficial comandante não é ninguém sem os
seus soldados. Eu tive sempre muita
vaidade nos meus soldados, sargentos e
oficiais, que eram realmente valentes; e
o que eu fui, foi à custa deles, com
eles e por eles.
[...]
As
Forças Armadas combateram em África sem
ter havido cronistas, como aqueles
cronistas militares que havia antes e
que transmitiam ao povo português os
exemplos do que as Forças Armadas
faziam: vai ser difícil contar aos
vindouros o que foi aquela guerra,
porque pouca coisa escrita ficou.
[...]
Quase
ninguém hoje
[1995]
deve estar convencido de que o 25 de
Abril não devia ter existido; não como
foi e com as consequências que teve, que
foram desastrosas, pois em alguns
aspectos houve uma inversão completa de
valores. Sofri uma prisão em Caxias, a
11 de Março, sem saber porquê. Depois
tive de voltar a ser operado devido à
imobilidade que tive na prisão. Não
tenho uma perna mas tenho uma prótese, o
que também tem as suas vantagens: se me
pisam, não me dói... »
¹
Posteriormente, desligado
do serviço e com o posto de coronel,
passou uma temporada em Israel ao
serviço da 'intelligence' daquele país;
e anos depois radicou-se em Espanha.
Faleceu no dia 15 de Março de 2002, como
Coronel de Infantaria 'Comando' na
situação de reforma extraordinária.
A sua
Alma repousa em Paz.
-----------------
¹
(excertos do seu depoimento, publicado
em 14Nov1995 no livro "Os Últimos
Guerreiros do Império")